Acadêmicos que acreditam que a criação supera a natureza também tendem a duvidar do método científico

Até que ponto o pensamento evolutivo permeou a academia? Uma pesquisa com mais de 600 acadêmicos de 22 disciplinas, desde psicologia e economia até estudos de gênero, sociologia e humanidades, descobriu que existem duas culturas distintas na academia, pelo menos em relação às principais causas do comportamento humano e da cultura humana.

Um grupo formado por psicólogos, economistas, filósofos e cientistas políticos acredita mais fortemente nas influências genéticas no comportamento, nas crenças e na cultura. O outro grupo, que consiste em sociólogos, antropólogos não-evolutivos, acadêmicos de estudos de gênero e todos os acadêmicos de humanidades (exceto filosofia), acredita na primazia das influências ambientais.  Além disso, os acadêmicos que favorecem as influências ambientais também tendem a ser céticos quanto ao método científico. Os resultados foram publicados com acesso livre no recém lançado jornal “Evolutionary Studies in Imaginative Culture”.

Joseph Carroll na Universidade de Missouri em St. Louis e seus colegas, incluindo Mathias Clasen da Universidade de Aarhus, identificaram acadêmicos influentes de diferentes disciplinas com base nos artigos dos principais jornais de cada área. Cada participante avaliou sua concordância com 24 declarações relativas ao debate sobre a natureza/criação e as interações genético-ambientais. O campo favorecendo explicações genéticas tende a concordar mais fortemente com afirmações como “O comportamento humano é produzido predominantemente ou exclusivamente por características geneticamente transmitidas”. O outro campo avaliou mais fortemente itens como “O comportamento humano é produzido predominantemente ou exclusivamente por condições ambientais, incluindo convenções culturais”.

Um vislumbre de esperança para um futuro consenso foi encontrado no fato de que ambos os campos tendiam a responder afirmativamente aos itens pertencentes a interações genético-ambientais, tais como “Os valores, crenças e sentimentos humanos são produzidos por uma interação entre adaptações moldadas pela seleção e por condições ambientais, incluindo convenções culturais”.

No entanto, os sinais de consenso foram um pouco prejudicados pelos comentários abertos dos participantes, que mostraram que os dois campos tinham uma perspectiva diferente sobre o que as interações do ambiente gênico significam. Por exemplo, sobre o tema da identidade de gênero, um acadêmico evolutivo das ciências sociais disse: “Eu acredito que a identidade de gênero reflete uma mistura de insumos genéticos e culturais, sendo o genético um pouco mais importante”, enquanto um estudante de estudos literários disse: “Eu concordo que as características biológicas desempenham um papel na formação da identidade de gênero, mas eu absolutamente discordo de que elas o façam ‘predominantemente'”.

Talvez o mais preocupante, no sentido de minar as esperanças de qualquer consenso futuro sobre a compreensão do comportamento humano e da cultura, é que os acadêmicos que favoreceram as explicações ambientais e culturais de comportamento também tendiam a duvidar do método científico:

“O comportamento humano não está sujeito a leis imutáveis, e, portanto, não pode ser estudado cientificamente”, disse um acadêmico de estudos religiosos. “O conhecimento científico tem algo a nos dizer sobre artefatos materiais e sua produção, mas ‘natureza humana’, ‘experiência humana’ e ‘comportamento humano’ não são empiricamente estáveis”, disse um acadêmico de estudos literários.

Em contrapartida, os acadêmicos que favorecem causas genéticas e evolutivas do comportamento expressaram fé na ciência.

Carroll e seus colegas disseram que sua pesquisa forneceu uma “fotografia estatística… de uma paisagem em constante mudança” das opiniões divergentes sobre a natureza humana e a cultura mantidas pelas ciências sociais e humanas. Seu próprio sentimento otimista é que essa opinião está se movendo “inequivocamente para uma visão biocultural integrada do comportamento humano”.

Então, alguma vez será construída uma ponte entre essas duas culturas? O maior obstáculo, acreditam os pesquisadores, são os acadêmicos que declaram que o comportamento humano não pode ser estudado cientificamente (considere os pontos de vista de outro acadêmico de estudos étnicos: “Eu não acredito na evolução genética das espécies” — escreveram — “Há uma marca de divindade em cada pessoa que garante nossos pontos comuns”). Carroll e seus colegas disseram: “A maioria dos pesquisadores que consideram o comportamento humano fora do alcance da ciência ou que negam que a ciência possui reivindicações especiais sobre a produção do conhecimento, tem mais respeitabilidade acadêmica que os criacionistas, mas são semelhantes a eles, na medida em que eles pisam de bom grado fora do círculo do conhecimento suscetível à falsificação empírica”.

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Por Christian Jarrett, na Research Digest, traduzido por Douglas Ramos para a LiHS.

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