Cotas: Quem são os futuros acadêmicos e profissionais da UFRGS.

Trabalho à noite, viro a madrugada trabalhando. Pego 3 ônibus pra ir trabalhar. Pela manhã (virado) vou direto para o cursinho pré vestibular onde consegui uma bolsa de estudos. Cansado e com sono, me esforço ao máximo para entender a matéria que me lecionam durante o dia. Nos finais de semana não posso estudar, pois tenho que cuidar dos meus 2 filhos. Sou branco e não tenho direito às cotas, pois estudei em escola pública da 6ª série do ensino fundamental ao 3º ano do ensino médio e não da 5ª série ao 3º ano, como determina a lei para o benefício das cotas na UFRGS. Mesmo assim, correndo em busca do meu único sonho, me inscrevi para o vestibular de medicina e minha nota foi superior a 700, mas não tive minha redação corrigida. Esse escore que obtive não me aprovou no vestibular, porém consegui novamente uma bolsa no curso pré-vestibular para batalhar novamente pela minha vaga em 2013. 

 
Quando a UFRGS divulgou o quadro de lotação por curso de 2012 muitos vestibulandos ficaram estupefatos ao ver que o último estudante autodeclarado negro que entrou no curso de medicina fez uma média harmônica de 565,58 pontos, ou seja, pouco mais do que meio desvio por matéria. Mas isso não é o pior. No concurso vestibular para direito (diurno) o último autodeclarado negro obteve um escore de 480,6, e em quase todos os cursos de engenharia o último colocado autodeclarado negro fez um escore INFERIOR A 450!! Isso quer dizer que estimando-se um número de acertos que esses candidatos obtiveram na prova de matemática (fundamental à engenharia), poderiamos dizer que acertaram entre 8 e 9 questões de 25! Isso mesmo! São esses os candidatos a engenheiros, médicos e advogados que a UFRGS receberá em 2012. Gente que mal compreende o básico das ciências escolares está entrando numa faculdade federal enquanto alunos mais qualificados e mais esforçados ficam de fora.
 
Até quando o governo vai continuar tapando o sol com a peneira? Para mascarar um ensino público precário, o governo lança mão de um sistema de ingresso ao curso superior que é injusto e racista. Enquanto funcionários do legislativo de Brasília ganham mais de 16 mil reais mensais, professores da rede pública recebem pouco mais do que um salário mínimo. O problema está na base da estrutura educacional e não na porta da universidade! 
 
Enquanto o verdadeiro problema não é resolvido, o sistema de cotas poderia se mostrar uma boa alternativa se fosse mais justo. Dos 7266 inscritos para medicina, 167 eram autodeclarados negros de escola pública, ou seja, 3,2% de todos os candidatos. No entando a UFRGS reserva à esses candidatos 15% do número total de vagas.
 
“Parabéns”, UFRGS, pelo sistema precário de seleção e pela disseminação do racismo no RS, porque, infelizemente, não tem como deixar de incitar a discriminação a esses candidatos com uma contravenção tão grande ao aprovar essa medida que pretende colocar de qualquer jeito 15% de candidatos autodeclarados negros, promovendo a oposição dos próprios outros cotistas de escola pública, que agora ficaram em uma disputa ainda mais acirrada entre si, enquanto veem uma confortável e estacionada média que incluirá esses candidatos sendo selecionados com meritocracia zero.

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3 comments

  • Eu concordo também com as cotas sociais. Só não concordo com as cotas raciais. O ensino público precário é o mesmo para brancos, pretos, amarelos, vermelhos, azuis… Separar as pessoas pela cor da pele é racismo.

  • Os candidatos cotistas de ensino público entram com uma nota levemente inferior a daqueles do acesso universal. Entretanto cotistas autodeclarados negros entram com uma nota muito inferior. Na medicina por exemplo os cotistas raciais entram acertando, em média, de 8 a 10 questões a menos que os demais candidatos num total de 25 questões. Veja bem, eu não estou reclamando pelo fato de ter chegado perto e não ter entrado na medicina pois se não existissem cotas eu não teria me classificado de qualquer forma, só estou condenando um sistema de seleção tão injusto com uma discrepancia tão gritante entre os candidatos de um mesmo curso.

  • Notas dos cotistas raciais< notas (médias) do ensino público< notas do ensino privado.

    Em geral, as vagas para cotas de ensino público são bem maiores que as raciais. Geralmente reservam-se vinte vagas para privadas, vinte para públicas e cinco para raciais provindos de escola pública (não sei se é assim na Ufrgs, mas a maioria das universidades na qual conheço que utilizam esses tipos de cotas é parecido com isso). A reserva de vagas nesses termos está condizente com a desigualdade acima.

    Também sou a favor de que melhorem o ensino público; mas na boa pessoal, todos sabem que qualquer investimento em educação o retorno será no mínimo a longo prazo, e as desigualdades acumuladas não podem esperar tanto. A economia do Brasil não vai crescer eternamente, é preciso inserir todas as “minorias” enquanto ainda estamos no “boom”.