Nota de repúdio: Revista Veja demoniza estudantes da USP

Com autoria de Marcelo Sperandio, a revista VEJA de 9 de novembro traz reportagem sobre os alunos que ocuparam a reitoria da Universidade de São Paulo, texto em que os estudantes são tratados com um tom desrespeitoso e inesperado para a prática jornalística.
Os ativistas são descritos como “birrentos”, “vândalos” e “filhinhos de papai”. A reportagem insinua que a única bandeira dos alunos é a descriminalização da maconha, ou ainda, um suposto desejo de poder usar a droga ilegal no campus sem a interferência da polícia. O artigo parece ter sido escrito sem uma única entrevista para saber a posição dos manifestantes, com uma tentativa de desqualificá-los pela porcentagem minoritária que têm frente ao número total de estudantes da USP, numa concessão subliminar à ditadura da maioria em vez de ao mérito das necessidades e argumentos em questão.
Ocupações de reitorias em universidades públicas têm acontecido repetidamente no país nos últimos anos. Na opinião de alguns como Zuenir Ventura (autor do livro “1968: o ano que não terminou“), a medida da ocupação é drástica e exagerada. Mas julgar os métodos é bem diferente de julgar as ideias. Independente da natureza dos métodos inadequados de ativismo dos estudantes, é preciso ouvir quais são seus argumentos e reivindicações, em vez de tentar desqualificá-los pelo vestuário, idade ou classe social.
Agora que foram retirados à força do prédio, e há denúncias de centros acadêmicos sobre cerceamento da liberdade de outros estudantes por parte da força militar, perguntamos se é um caso que se encaixa na avaliação da Human Rights Watch, que aponta a truculência antidemocrática da força policial brasileira como um problema crônico no país. Há relatos até de discriminação da força policial contra manifestações de homoafetividade entre estudantes na USP.
VEJA e outros órgãos de imprensa estão capitalizando sobre o absoluto preconceito vigente sobre o uso da Cannabis que persiste no Brasil e está sendo corajosamente combatido por Fernando Henrique Cardoso e todos aqueles que estão do lado da ciência e da verdade sobre os danos da política antidrogas, especialmente no caso desta erva ritualística dos citas.
É completamente irrelevante, e uma forma de preconceito de classe, apontar se os alunos usam roupas de tal marca ou se são fidalgos. É surpreendente que haja um clima noticioso depreciativo contra os estudantes, quando frequentemente quem se comporta de forma muito mais nociva são dirigentes de universidades, como o ex-reitor da UnB Timothy Mulholland, que renunciou após ser denunciado por improbidade administrativa (o caso da famosa lixeira de 900 reais); e o próprio reitor da USP João Grandino Rodas, que enfrenta acusações da Faculdade de Direito, que o nomeou ineditamente com o título de persona non grata.
Se as denúncias contra ambos administradores procedem, certamente são casos bem piores do que fumar maconha, sob próprio risco individual. (Risco que é pequeno, dado o conhecimento científico sobre o tema; e que é tão culpável pela violência e pelo tráfico quanto o álcool é culpável por Al Capone.)
Dados os motivos acima, repudiamos a reportagem de Sperandio veementemente, e repudiamos o absoluto mau gosto e amadorismo jornalístico de VEJA por publicá-la, que assim só contribui para a ignorância, o preconceito e a supressão do debate honesto no nosso país.
Atenciosamente,

Eli Vieira
presidente da Liga Humanista Secular do Brasil.

A terra não precisa ser educada: o homem sim!

                 Blog Preso por Fora 
        Enchentes, tsunamis, furacões, deslizamentos de encostas, degelos, entre outros fenômenos, para o ser humano, a cada manifestação destes fenômenos, as perdas podem ser inestimáveis, tanto materiais quanto em valores e apegos mais abstratos. Vive-se cada vez mais uma tensão apocalíptica. No entanto existem soluções viáveis para que haja uma guinada a um horizonte distante do fim.
       Em um texto recente o filósofo, teólogo e ecólogo Leonardo Boff disse que a terra não precisa ser cuidada, pois ela cuida de si mesma, que possui mecanismos para auto-regenerar-se. Boff, com dados científicos informa também que a terra precisaria de um descanso de um ano e meio sem a intervenção humana para que voltasse a um ideal sadio, a sua plena forma como natureza que deveria ser, salvo é claro, espécies que já entraram em extinção. Do retorno destes animais extintos a ciência já está cuidando, é tema para outro texto.
      Sendo assim, portanto seria lógico afirmar que o que precisa ser transformado, este: o ser humano e seus hábitos culturais, sua maneira de produção, sua forma de eliminar os seus lixos e inclusive, mudar a maneira que produz seus lixos, etc. O consumismo, que influencia na produção de cada vez mais bens supérfluos e que por sua vez gera mais e mais lixos, que, aliás, demoram a ser degradados na natureza, sim, deve haver se não o fim desta maldição e nova configuração sociológica que é o consumismo, ao menos uma diminuição significativa deste horrendo hábito cultural.
        Referente ainda ao consumismo, vale citar que o asceta e pacifista indiano, Mahatma Gandhi, nos ensina que “Cada dia a natureza produz o suficiente para as nossas carências. Se cada um lhe tomasse o que fosse necessário, não havia pobreza no mundo e ninguém morreria de fome.” Hoje em dia, além da fome e da pobreza, o lixo gerado por um desenfreado consumismo é enorme e acaba que resulta em efeitos na terra em que homem tem, agora, que arcar com suas conseqüências. No entanto, através de uma educação focada no bem comum, na igualdade e na fraternidade, prezando também a liberdade e uma democracia eficaz, é que transformarão os hábitos culturais prejudiciais a natureza, tão logo, a humanidade.

 

     Assim, com um esforço humanista indomável, um potencial que temos, com respeito ao próximo, e de dedicação poderemos evitar tragédia e, além do mais, não deixa de ser uma bela oportunidade de evolução do comportamento humano. Não devemos nos alegrar com apenas uma evolução científica, devemos e podemos, sim, podemos nos tornar cada vez mais humanos, recuperar a humanidade perdida e isso, juntos! Pois, “Ninguém liberta ninguém, ninguém se liberta sozinho: todos se libertam em comunhão!”, disse o mestre Paulo Freire e, são nestas perspectivas que podemos começar a construir um mundo cada vez melhor!

Lucas Gonzaga 

Um texto que pode complementar este que você acabou de ler é esse aqui:

Prioridades do mundo (?)

O suicida que odeia clichê

    
     Preso por Fora
       Ele decidiu, andou, correu: chegou ao prédio. Lembrou que todos o tinham conversado com ele sobre o assunto, que não deveria se entregar, que deveria lutar pela vida, que ele é capaz. Achou aquelas frases de feito terríveis, parecia até que as pessoas não tinham apreço por ele, que queria exibir suas frases prontas que aprenderam em seus livros de auto-ajuda. Pensou “Ninguém esta aí mesmo para mim…”. Tais palavras, conselhos e tal, não o surpreendiam. Ouve sempre essas repetições em igrejas, filmes, livrinhos bobos.
 
    
  A cada degrau que subia a força por suicida-se aumentava, estava cada vez mais convencido de que não havia mais nada a fazer além de suicidar-se. Desviou verba da igreja no qual era membro, faliu a própria empresa, maltratou seus funcionários, castigou severamente seus filhos e bateu em sua mulher. Era empresário famoso. Muitos o odiavam, e por que não dizer que todos o odiavam?
      
Chegou em cima do prédio de 30 andares, olhou para baixo, ficou ainda pensando na vida, nos filhos, na família, nas pessoas que amava. Estava extremamente arrependido e envergonhado. Lembrou das frases de efeitos que disseram-lhe naquele dia e ao decorrer da semana, mas que tinha nojo.
    
   A multidão começou a se formar abaixo na rua. E ele pensava, pensava e pensava. Lembrou de quando na infância e na adolescência havia praticado ginástica olímpica, resolveu então pular com cambalhotas, iria terminar a vida da melhor forma possível. Estendeu as mãos como quem se prepara para fazer sua ornamentação, seu salto artístico e ficou um certo tempo nesta posição preparando-se. O lado pitoresco da história é que ele resolveu saltar do prédio onde ficava a empresa dele, prédio que foi dono e por algum motivo estranho, todos os 2.550 ex-funcionários agora saiam do prédio e fazia por lotar, não só a rua, mas a grande praça que a havia em frente, juntando-se a multidão do centro da cidade que lá estavam.
      
_ Ué, mas num é o patrão?- perguntou a ex-faxineira.
     
  _ Ex-patrão! Sim, é ele mesmo, mas lembre-se bem, é o EX- patrão!- respondeu o ex-gerente de marketing.
_ É o patrãããão!- Gritou alguém colocando as mãos na cabeça ao que alguns responderam _ EEEEX – PATRÃO!
      
       E formou-se o reboliço, começaram as fofocas, as conversas.
        
       Ele, o aspirante a suicida, percebeu que as vozes lá de baixo aumentavam em conversas e mais conversas. O corpo de bombeiro chegou. O suicida começou a observar que surgia gritos organizados da multidão abaixo, mas ainda não entendia o que gritavam, o som crescia cada vez mais até que ele entendeu:
       
  _Pula, pula, pula, pula, pula!
      
          Finalmente palavras que o surpreendeu. Tirou a pose e começou a olhar a multidão. O mundo não era robótico. Numa tentativa de suicídio quem em sã iria consciência gritar para pular por mais que o suicida seja uma pessoa ruim?
       
         Estava com um sorriso e agora em um transe, estupefato! E o gritou organizado mudou, deixando-o ainda mais com uma alegria irradiante. Agora o era uma musiquinha:
       
       _ Se Oswaldo não pular, olé, olé, olá, eu vou chorar!
       
             Oswaldo era o nome dele. Ele já esteve na frente de multidões assim incansáveis vezes, fazendo palestras e dando avisos aos seus muitos funcionários. Nestas reuniões os funcionários aplaudiam-no e todo o mais, porém ele sabia que era aplauso de funcionário puxando saco de patrão, pois, qual o motivo que tinham de aplaudir se não o de puxar saco, tendo em vista que era um péssimo patrão? Daí é que ele ficava mais irritado, pois sabia que as bajulações eram falsas.
     
          Agora, estava anestesiado de felicidade com as musiquinhas e gritos organizados pedindo para que ele pulasse, sentia mais confiança de viver no mundo. Ele preferia  um mundo com uma honestidade dura do que com aparência de feliz, mas falso. Agora os gritos organizados eram espontâneos. Oswaldo, acenou para baixo, mandou beijos, fez um sinal de coração juntando as mãos. Enfim, virou as costas e povo reagiu:
   
        _ Aaaaaaaaaaaaaaah!
      
           Ele ouviu a insatisfação do povo lá embaixo e ficou ainda mais motivado a viver, a descer do prédio e descer a vida. O que ele nunca havia pensado e a mulher guardou em segredo, é que, após ler a carta de suicídio dele, dizendo que se ouvisse algo que não seja clichê ou falso ou robótico, ele gostaria de voltar a viver. Depois que a mulher leu esta carta, correu para o ex-local de trabalho dele, percebeu a multidão, olhou para cima e viu o marido e começou a pensar em algo que não fosse clichê. Até que puxou os coros, os gritos organizados, as músicas. Sabia que provavelmente surpreenderia o marido.
     
        O marido desceu do prédio, ela o beijou tentando prender gargalhada que insistia em querer sair.