Há que desarquivar

Dizer que o Golpe Militar de 1964 foi uma “Revolução Democrática” não é ser de direita, é ignorância ou dissimulação.
O que aconteceu em 1964 foi, entre outras coisas, uma repressão de movimentos sociais que buscavam a concretização das Reformas de Base (que não, não incluíam instaurar a ditadura do proletariado).
Talvez a faceta mais interessante desse evento histórico, para humanistas seculares, foi o cisma entre o “baixo clero” da Igreja Católica, especialmente as alas que lutavam por justiça social, e o alto clero, que tendeu a apoiar o evento tefepético da “Marcha da Família com Deus pela Liberdade”.
A diferença entre a preocupação dos primeiros com o povo e o apelo popular dos últimos na tal marcha é justamente um divisor entre o efeito benéfico da religião ao lutar contra o sofrimento e o efeito nefasto da doutrinação, do dogmatismo, da “ovelhização” do ser humano e do conhecidíssimo parasitismo social de parte do clero.
Há ainda aqueles que dizem que o Golpe nos “salvou” de uma ditadura comunista. Isso é bastante curioso diante do fato de que a “ameaça comunista” foi a mesma desculpa usada por Getúlio Vargas para continuar no poder implantando o “Estado Novo” em 1937 (que apesar do nome, não era nada novo… era o velho autoritarismo mesmo). Curioso que o único levante armado contra a implantação da ditadura getulista veio dos integralistas, no exato oposto do comunismo, pois são o que podemos chamar de versão brasileira de movimento fascista.
O século XX passou, 21% dele sendo ocupado no Brasil por um regime assassino e supressor, especialmente após o Ato Institucional nº 5, que arrancou a última focinheira de instituições como o DOI-CODI. Se de fato o Golpe evitou a revolução comunista, é difícil saber por que motivo torturas e estupros ajudariam na nossa “salvação”.
De fato, até hoje a ideologia comunista grassa nas universidades, especialmente as públicas. Não é muito difícil imaginar o porquê, até Winston Churchill, em uma de suas tiradas, reconheceu o apelo que tem o igualitarismo comunista no coração dos jovens. O pensamento marxista sofreu duros golpes, especialmente da filosofia da ciência, e hoje é defendido basicamente por dois tipos da fauna universitária: os pensadores que acham que filosofia é comentar e idolatrar autoridades mortas, fazendo apenas pés-de-página a suas teorias; e os jovens ingênuos, com uma ideia fresca e desinformada de natureza humana, de política e de ciência. Foram esses, além é claro de uma massa de impotentes acusados de conspiração comunista por coisas tão simples quanto sair de casa sem documentos, que sangraram neste lamentável período da história política brasileira que começou há 48 anos, no dia da mentira.
E nem tudo tem perdão. Há que desarquivar.
Eli Vieira
presidente da LiHS

Liga Humanista junta mais de 10 mil assinaturas contra proposta de emenda à Constituição 99/2011

Temos a satisfação de anunciar que nossa petição contra a proposta de emenda à Constituição nº 99/11 (PEC99), de autoria do Deputado João Campos (PSDB/GO), passou a marca de 10 mil assinaturas nesta quinta-feira.
Como acontece em outras petições da LiHS, cada assinatura foi enviada em tempo real para o email do órgão responsável, neste caso a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara.
A lista das assinaturas será enviada ao relator da proposta, Dep. Bonifácio de Andrada (PSDB-MG), em cujas mãos a PEC se encontra desde dezembro.
O texto original da proposta trazia assinatura de diversos parlamentares. Quando nós e o movimento LGBT denunciamos o caráter antilaico da proposta, um dos parlamentares, o Deputado Eudes Xavier (PT-CE) removeu sua assinatura.
A PEC99 pretende dar a associações religiosas o poder de propor ação de inconstitucionalidade e ação declaratória de constitucionalidade de leis ou atos normativos, o que na prática significa a criação de um poder teocrático, dado que somente entidades de interesse público diretamente ligadas ao Estado têm esta prerrogativa. O autor da proposta é um notório opositor dos (poucos) avanços conquistados em direitos LGBT no Brasil, e há motivos para acreditar que esta proposta veio para dar poder a seitas intolerantes de negar direitos que o STF reconheceu a esta parcela da população, como a união civil homoafetiva.
O número expressivo de assinaturas de nossa petição só aconteceu porque a Liga Humanista Secular do Brasil tem uma postura de tolerância para com diferentes crenças e luta por um Brasil secular e um Estado laico de fato, sob o qual toda a diversidade de opiniões e crenças convivam e cresçam juntas contra a intolerância.
Agradecemos por todas as assinaturas e lembramos que esta e outras petições se encontram abertas e disponíveis neste endereço.

One Law For All rally 2012

The Secular Humanist League of Brazil wishes to express our full support for the One Law For All movement and reiterate admiration for our dear honorary member Maryam Namazie. 
In Brazil we do not suffer from the problem of Sharia, since Islamists are a negligible minority. But we do know what it is like to have theocrats trying to impose their way of life on public power and society at large.
Muslims are welcome in the secular society as free participants in the belief system diversity every humanist cherishes, so every charge of “islamophobia” against this movement is lacking depth of analysis. The truth we witness in Europe is that a small but influent minority in Islam is trying, in a passive-agressive fashion by mimicking the cry of oppressed minorities, to undermine centuries of slow prosocial evolution by imposing Sharia law on human beings who are unlucky enough to be put under the label “Muslim”, many times against their will.
Every individual is a precious universe that has an opportunity to blossom into achievements of art, science and love. Human rights are an attempt to grant security to this process, and so is secular law. Sharia only tries to nip it in the bud.

Eli Vieira

president

Sobre a reportagem da Istoé sobre o Encontro Nacional de Ateus

Hoje, a Revista IstoÉ publicou uma reportagem sobre o Encontro Nacional de Ateus que acontecerá amanhã. Fomos pegos de surpresa pelo tom nada imparcial do texto de Rodrigo Cardoso.
Nós ateus estamos acostumados a sermos tratados de forma desigual em episódios memoráveis, como no programa de José Luiz Datena, que fez declarações preconceituosas pelas quais foi condenado na justiça, e no episódio em que a Sociedade Americana do Câncer recusou dinheiro ateu e depois tentou fingir que não foi por motivo de ateofobia (nome que nosso blog Bule Voador deu a este preconceito).
A reportagem produzida por Cardoso mistura de forma tendenciosa dois assuntos sem relação óbvia entre si: o encontro promovido pela Sociedade Racionalista, e a suposta construção de um “templo ateu” em Londres.  O jornalista sequer fez uma pesquisa básica sobre o assunto do “templo”, dado que reiteradamente o filósofo Alain de Botton, que respeitamos, já explicou que este não é o nome do projeto e muito menos a intenção. A comunidade ateia internacional definitivamente não parece querer emular o comportamento religioso.
Cardoso alega que o “universo virtual [é] uma espécie de igreja online para ateus”. Se for este o caso, aparentemente a internet é uma igreja para todos, ateus ou não, dado que é apenas uma ferramenta de aproximação para pessoas que aderem a qualquer forma de pensar. A escolha de termos que o repórter fez, como “professar”, “templo”, “cartilha” e “guru”, demonstra uma clara má vontade ou provocação desnecessária para com nosso grupo, algo decepcionante de se ler num veículo que existe para informar.
Lamentamos, também, o mau aproveitamento da entrevista dada pela organizadora Stíphanie da Silva, que também resultou da tentativa do repórter de aglutinar assuntos desconexos num só texto.
Não pensamos que uma porcentagem referente a um único grupo de ateus no Brasil seja amostra representativa da posição dos ateus brasileiros em geral sobre considerar a “religião” um “mal”, dado que uma parcela significativa de nós está feliz em compartilhar um país com pessoas que pensam diferente.
Por isso mesmo, nós que somos humanistas lutamos por um Estado laico e uma sociedade aberta e secular, com uma convivência de todas as crenças e posturas filosóficas, inclusive o ateísmo.

Att,
Eli Vieira e Åsa Heuser
presidente e vice-presidente da Liga Humanista Secular do Brasil