Humanismo não faz mal a ninguém

A igualdade de direitos civis fortalece o Estado de direito e faz bem a todos

Felizmente, um número cada vez maior de líderes religiosos desperta para o fato de que o avanço dos direitos da população LGBTI1 é uma questão de direitos humanos e de preservação e amadurecimento da democracia. Isso é alentador, especialmente quando se leva em consideração o arrefecimento da homofobia2 em alguns círculos dominados por fundamentalismos reacionários, baseados em projetos mesquinhos de segregação e dominação.
O uso dos meios de comunicação para reforçar o preconceito e promover a discriminação, seja ela qual for, especialmente contra uma minoria que se encontra socialmente vulnerável em muitos ambientes do território nacional, contraria os preceitos constitucionais expressos nos artigos 3º e 19 da Carta Magna:

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (…):IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.


Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:I – estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público.

Com isso em mente, e levando em consideração o uso difamatório das concessões públicas de mídia por parte de religiosos fundamentalistas, consideramos absolutamente apropriado que a ABGLT (Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Travestis e Transexuais – no uso de suas prerrogativas estatutárias – solicite às autoridades competentes a tomada de medidas juridicamente cabíveis quando a organizações midiáticas que veiculem conteúdo de ódio, seja por meio de produção própria ou de horário/espaço vendido a terceiros, desde que frustradas quaisquer tentativas de diálogo com os responsáveis.
Ateus e agnósticos, bem como religiosos de todas as possíveis denominações, devem primar pela manutenção da liberdade de expressão e da liberdade de crer ou não crer. Estes são princípios essenciais à manutenção da democracia porque constituem direitos fundamentais. Todavia, tais princípios estão subordinados a outro: o da dignidade humana. Por isso, não podemos aceitar manifestações notadamente discriminatórias contra indivíduos ou grupos auto-determinados, sejam eles sexuais, identitários, culturais, étnicos, ou outros quaisquer. Pronunciamentos que induzem ou legitimam o ódio, ou que igualam a homossexualidade à doença não estão sintonizados com os pensamentos ou sentimentos mais nobres de líderes civis ou religiosos que se prezem. Uma frase atribuída a Jesus Cristo – modelo máximo de virtude para os cristãos – diz: “Portanto, tudo o que vós quereis que os homens vos façam, fazei-lho também vós, porque esta é a lei e os profetas.”  (Mateus 7:12). Portanto, se os cristãos querem ter liberdade e respeito, precisam fazer o mesmo, para início de conversa.



Ademais, levando em consideração que o Brasil é signatário da Declaração Universal de Direitos Humanos (DDH), promulgada pela Organização das Nações Unidas (ONU), após a 2ª Guerra Mundial, e que nossa Constituição está em consonância com a mesma em seus princípios, vale relembrar que DDH claramente estabelece que:

Artigo I    Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão  e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade.

Este artigo, por si só, já ordena o fim de qualquer tipo de discriminação. Ele também apresenta um dever do qual ninguém está isento: agir com espírito de fraternidade para com todos. Isso vale para todo e qualquer grupo ou indivíduo e, obviamente, inclui tanto as igrejas como os homossexuais, seja no direito de serem respeitados como no dever de respeitarem. Os homossexuais, de per si, geralmente respeitam os heterossexuais como tais. Nenhum heterossexual jamais foi morto por discriminação sexual. Enquanto isso, 250 pessoas das minorias homoafetivas foram assassinadas em 2010, segundo informou o Grupo Gay da Bahia (GGB) em seu relatório anual. Portanto, uma lei que tipifique o crime de homofobia faz-se absolutamente necessária no Brasil, assim como já foi promulgada em vários outros países, inclusive no Chile recentemente (abril/2012), depois que um jovem gay foi assassinado por neonazistas. Enquanto isso, no Brasil, uma bancada evangélica viciada em preconceito por orientação sexual e identidade de gênero continua tentando impedir o avanço de legislação que demonstre, na prática, que o Brasil é um Estado de direito realmente e que, por isso mesmo, não compactua com essa crueldade.

Artigo II      Toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua,  religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição. 

Este artigo deixa muito claro que os direitos humanos são aplicáveis a todos os seres humanos, independe de qualquer condição. Uma pessoa não pode ser privada de nenhum direito por qualquer característica aparentemente distintiva – o que inclui a sua orientação sexual e identidade de gênero. Todavia, para que isso se efetive na prática, é necessário que haja legislação específica que efetive juridicamente os direitos desses seres humanos, indesculpavelmente ignorados pelo Estado. Isso não é privilégio; é justiça.

Artigo III            Toda pessoa tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.

De acordo com as mais recentes estatísticas, os casos de homossexuais assassinados no Brasil são quase seis vezes mais numerosos que no México e quase oito vezes mais que nos EUA. No mês de outubro de 2011, um cidadão homoafetivo foi morto a cada dia no Brasil, pura e simplesmente por homofobia. Logicamente, não estão computados aqui crimes com outras motivações.
Não há dúvida de que as pessoas LGBTI – como quaisquer outras – têm direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal. Portanto, não há razão justificável para se tolerar a promoção de ódio, uma vez que este gera a violência que vemos computada em estatísticas. É necessário lembrar que a biografia de cada LGBTI que é vítima de violência é afetada permanentemente, mesmo quando não resulta em morte. Violência verbal fere profundamente o indivíduo LGBTI, especialmente quando é muito jovem ou muito idoso, e estimula outros tipos de agressão por parte de pessoas que já carregam algum preconceito e pouca racionalidade. O Estado precisa proteger o cidadão quando este se encontra em situação de vulnerabilidade. É isso o que diz o Artigo VII:
“Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, à igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.”
Ou seja, o governo e a sociedade precisam coibir qualquer cidadão ou instituição de incitar outras pessoas a discriminar ou agredir, física ou verbalmente, quem quer que seja, inclusive os cidadãos homoafetivos.

Artigo XII      Ninguém será sujeito a interferências na sua vida privada, na sua família, no seu lar ou na sua correspondência, nem a ataques à sua honra e reputação. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques.

Desnecessário dizer que quando alguém calunia o amor entre pessoas iguais, está interferindo na vida privada de milhões de brasileiros. A difamação da homoafetividade, especialmente por motivação religiosa fundamentalista, afeta casais homossexuais, famílias homoparentais,  e constitui uma violação clara e gratuita contra o artigo XII, citado acima. Ninguém – mesmo que sob o pretexto da liberdade religiosa – tem o direito de interferir na vida privada das pessoas e de suas famílias e nem de transtornar suas interações públicas.
Vale relembrar que a Constituição Brasileira em seu artigo 3º diz o seguinte:

Art. 3º: Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (…):IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Infelizmente, depois de centenas de anos de propaganda anti-gay promovida por igrejas preconceituosas, por políticos apenas interessados em manter o status quo, e por famílias viciadas em preconceitos perpetuados por tradições mantidas sem o menor questionamento, os cidadãos LGBTI têm despertado para a luta democrática pela garantia de seus direitos civis.
Esforços corajosos de pessoas que não suportam mais a privação de seus direitos e liberdades, porque simplesmente amam alguém do mesmo sexo, têm conquistado avanços nos campos político e jurídico, desenvolvendo políticas de inclusão e de reparação de injustiças. 
Além disso, uma parcela cada vez maior da sociedade tem visto que não existem “fantasmas atrás do armário” e tem apoiado os homossexuais em sua luta pelo reconhecimento de seus direitos civis, a despeito das estratégias de manipulação de alguns reacionários políticos e religiosos.
Uma sociedade justa é uma sociedade comprometida com a garantia de direitos básicos iguais para todos.  Por isso, entendemos que o Estado democrático de direito nunca poderá ser considerado como uma coisa acabada, pronta, finalizada. Ele estará sempre em processo. 
É inaceitável que se admita qualquer tipo de ação ou pregação que ameace os cidadãos ou o próprio Estado de Direito  –  o que não impede de modo algum o funcionamento de qualquer agremiação religiosa. Pelo contrário, inúmeras igrejas e associações religiosas já se abriram para a isonomia dos cidadãos LGBTI, sem qualquer prejuízo para seu bom funcionamento e para o bem-estar de suas comunidades. Seria estranho se ocorresse o contrário, uma vez que isso só deporia contra o próprio cristianismo, ficando estabelecida uma relação entre preconceito e subsistência. Entretanto, se o cristianismo realmente tem no amor sua essência, ele naturalmente se alinhará a todas as formas de combate à injustiça, inclusive aquelas praticadas contra os cidadãos homoafetivos.
Por isso, outras formas de injustiça supostamente baseadas na fé foram abolidas (ou tem sido) na sociedade, apesar de não se ter mudado um til das escrituras cristãs, e sem que isso impedisse o funcionamento das igrejas.  Vale lembrar que práticas como a escravidão, a xenofobia, e a dominação da mulher foram abolidas, graças a ideais humanistas, mesmo sob protestos por parte de alguns setores do cristianismo. O mesmo ocorre atualmente com relação aos direitos civis dos indivíduos LGBTI.
Felizmente, muitas denominações e outras organizações cristãs têm revisto os conteúdos homofóbicos de suas prédicas e práticas. Entre elas, citamos os seguites:

Episcopais Americanos

Em março de 2010, a igreja Episcopal aprovou a eleição de uma bispa-assistente lésbica na Diocese de Los Angeles. Ela é, portanto, o segundo bispo homossexual assumido na comunhão anglicana global. O primeiro foi o bispo Gene Robinson, episcopal americano.

Anglicanos Ingleses

Em fevereiro de 2010, a Igreja da Inglaterra tomou uma atitude progressista: votou por estender os mesmos direitos previdenciários aos parceiros gays do clero assim como são garantidos a esposas e maridos heterossexuais.
Essa atitude da Igreja da Inglaterra deve inspirar outras da mesma comunhão em diversos países do mundo.

Presbiterianos Americanos

Em outubro de 2010, a Igreja Presbiteriana dos EUA ordenou ao pastorado Scott Anderson, primeiro ministro abertamente gay daquela denominação. Ele havia servido como ministro em Sacramento, na Califórnia, de 1983 a 1990, quando teve de se afastar da igreja por causa de chantagem de um casal da congregação que ameaçou revelar sua orientação sexual. Ele, porém, reuniu a igreja e falou abertamente sobre sua orientação sexual, renunciando o ministério, porque a Igreja Presbiteriana dos Estados Unidos não permitia que homossexuais servissem como pastores. Isso mudou em outubro desse ano, e o pastor que pregou na cerimônia de ordenação dele foi, em outros tempos, um dos mais ferrenhos perseguidores dos homossexuais. Tudo isso só foi possível, porque em 2009, uma assembleia nacional da igreja votou pela revogação da regra, permitindo da ordenação de Anderson.

Santos dos Últimos Dias

A Igreja dos Santos dos Últimos Dias (ISUD) ou igreja dos mórmons, como alguns a conhecem, é considerada ultraconservadora, no que diz respeito às suas doutrinas e práticas, mas em 2010, pela primeira vez em sua história, mostrou apoio à causa gay ao defender uma série de textos contra a discriminação aos homossexuais que tramitaram no conselho municipal de Salt Lake City, no estado de Utah, nos Estados Unidos.


A ISUD considerou a lei “justa, razoável e não violenta a instituição do matrimônio”, conforme disse seu porta-voz.  Utah é onde fica a sede da Igreja Mórmon, que possui cerca de 14 milhões de fiéis em todo o mundo.


Igrejas no Brasil

Além das diversas igrejas chamadas inclusivas (um movimento recente no país que abraça e celebra a diversidade sexual), um fato chamou a atenção. A Aliança de Batistas do Brasil aplaudiu a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que concede direitos civis a pessoas do mesmo sexo vivendo em união estável.
No entanto, o casamento gay não é uma questão religiosa, diga-se de passagem. É um direito civil, efetivado em cartório, envolvendo o sistema jurídico do país. As cerimônias nesta ou naquela comunidade de fé, dependem da crença dos nubentes e da abertura de seus sacerdotes e/ou associações religiosas. O propósito da citação das igrejas acima é apenas o de demonstrar que celebrar a diversidade sexual não depõe em nada contra a espiritualidade dessas comunidades religiosas.
É necessário que os reacionários a esses avanços no campo do direito e contra seus desdobramentos políticos, sociais e econômicos abandonem palavras e expressões que incitem o ódio e o medo. Basta de violência física e verbal.
Neste mês (abril/04), a Igreja Anglicana do Brasil, na pessoa de seu Arcebispo Primaz Dom Ricardo Loritte de Lima, manifestou seu apoio à ABGLT quanto ao processo em andamento no judiciário, por causa da insistente difamação contra as pessoas homoafetivas em programa de TV mantido por um pastor evangélico do Rio de Janeiro. Ele diz literalmente o seguinte: “Querido Toni, receba o apoio integral da Igreja Anglicana do Brasil, que fiel ao ensinamento do Mestre Jesus, ama e acolhe a todos, sem distinção nenhuma! (…) Os líderes religiosos devem estar a serviço dos direitos humanos e não da discriminação e ódio.” O pensamento e o sentimento de Dom Loritte estão em perfeita consonância com qualquer humanismo mínimo.
Desejamos ver outros líderes e comunidades fazendo o mesmo, pois já existe muita violência em andamento. Tudo o que mais precisamos no momento é de paz e esta não pode ser promovida por meio de pregações acachapantes contra os homossexuais. Não temos dúvida de que o ofício pastoral ou sacerdotal pode ter sua utilidade quando seus representantes usam seu poder de comunicação e mobilização para combater o que mina o progresso do nosso país: questões como as drogas, a violência urbana e doméstica, a corrupção, a desigualdade social, o tráfico de mulheres e crianças, enfim, temas que prejudicam a população brasileira como um todo, porque também violam os direitos individuais e colocam em risco o bem-estar social. Por outro lado, prestam um desserviço quando promovem injustiças e acentuam discriminações. Para realizar seu trabalho, nenhuma igreja ou sacerdote/pastor precisa falar dos homossexuais, nem para bem nem para mal. Basta deixar essas pessoas em paz. Certamente, o ofício pastoral vai muito além dessa estranha e obstinada preocupação com “quem ama quem”.
Sergio Viula
Presidente do Conselho LGBT da LiHS
1 – A sigla LGBTI designa lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais, transgêneros e intersexuais.
2 – Homofobia: 

“Um conjunto de emoções negativas (tais como aversão, desprezo, ódio, desconfiança, desconforto ou medo), que costumam produzir ou vincular-se a preconceitos e mecanismos de discriminação e violência contra pessoas homossexuais, bissexuais e transgêneros (em especial, travestis e transexuais) e, mais genericamente, contra pessoas cuja expressão de gênero não se enquadra nos modelos hegemônicos de masculinidade e feminilidade. A homofobia, portanto, transcende a hostilidade e a violência contra LGBT e associa-se a pensamentos e estruturas hierarquizantes relativas a padrões relacionais e identitários de gênero, a um só tempo sexistas e heteronormativos” (JUNQUEIRA, Roberto Diniz. O Reconhecimento da Diversidade Sexual e a Problematização da Homofobia no Contexto Escolar. Rio Grande do Sul. Editora da FURG, 2007, p. 60-61.)

Liga Humanista junta mais de 10 mil assinaturas contra proposta de emenda à Constituição 99/2011

Temos a satisfação de anunciar que nossa petição contra a proposta de emenda à Constituição nº 99/11 (PEC99), de autoria do Deputado João Campos (PSDB/GO), passou a marca de 10 mil assinaturas nesta quinta-feira.
Como acontece em outras petições da LiHS, cada assinatura foi enviada em tempo real para o email do órgão responsável, neste caso a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara.
A lista das assinaturas será enviada ao relator da proposta, Dep. Bonifácio de Andrada (PSDB-MG), em cujas mãos a PEC se encontra desde dezembro.
O texto original da proposta trazia assinatura de diversos parlamentares. Quando nós e o movimento LGBT denunciamos o caráter antilaico da proposta, um dos parlamentares, o Deputado Eudes Xavier (PT-CE) removeu sua assinatura.
A PEC99 pretende dar a associações religiosas o poder de propor ação de inconstitucionalidade e ação declaratória de constitucionalidade de leis ou atos normativos, o que na prática significa a criação de um poder teocrático, dado que somente entidades de interesse público diretamente ligadas ao Estado têm esta prerrogativa. O autor da proposta é um notório opositor dos (poucos) avanços conquistados em direitos LGBT no Brasil, e há motivos para acreditar que esta proposta veio para dar poder a seitas intolerantes de negar direitos que o STF reconheceu a esta parcela da população, como a união civil homoafetiva.
O número expressivo de assinaturas de nossa petição só aconteceu porque a Liga Humanista Secular do Brasil tem uma postura de tolerância para com diferentes crenças e luta por um Brasil secular e um Estado laico de fato, sob o qual toda a diversidade de opiniões e crenças convivam e cresçam juntas contra a intolerância.
Agradecemos por todas as assinaturas e lembramos que esta e outras petições se encontram abertas e disponíveis neste endereço.

Manual para organizar um evento Taverna Cética na sua cidade


Do Conselho de Eventos da LiHS
Somos seres racionais, capazes de elaborar um sistema de aceitação e rejeição de proposições: o ceticismo.
Sua mãe é capaz de prever através de sonhos se você vai ter uma desinteria ao comer acarajé? Suas pílulas de açúcar e seus frascos de água agitada e diluída sobre mais água curam moléstias do corpo e da mente? Suas agulhas espetadas sobre pontos mágicos do corpo substituem a fisioterapia? Jura que os seres vivos foram fabricados na linha de montagem do pai celeste dos hebreus?
Você pode ser uma pessoa muito legal e acreditar sinceramente nisso tudo, mas para fazer um cético aceitar essas coisas vai ter que fazer melhor do que dizer que funcionou para a prima do filho da sogra do amante daquele seu amigo que me emprestou um real aquela vez.
Céticos gostam de seu conhecimento do jeito que nutricionistas gostam da comida: bem preparada, fresca, com ingredientes de boa procedência, e nutritiva na medida certa para garantir a continuidade da saúde. Desculpe, mas essa história de que seu amigo nerd consegue fazer um moto-perpétuo é o equivalente epistemológico de salada de maionese estragada: eu é que não vou engolir esse troço.
Mas (mas?) também somos seres sociais. Mais (menos?) que isso: somos primatas peludos, flatulentos e carentes, que adoram gastar seu tempo se divertindo das formas mais ineficientes e absurdas que a vã filosofia jamais imaginaria (conhece 9gag? Frisbee? Caça-níqueis? Badminton? Vídeos de gatinhos e cãezinhos no YouTube? …).
Razão e Diversão: por que não juntar as duas coisas? É para isso que acontecem, regularmente, mas à moda do andar do bêbado, em mais de 60 cidades no mundo todo, os eventos Skeptics in the Pub (SiTP).

A gente ainda não escolheu qual é a tradução melhor. Usamos semvergonhamente o termo “Taverna Cética“. Os menos pomposos preferem “Céticos no Boteco”, os mais carinhosos, “Céticos de Botequim”. Digamos que neste assunto estamos ainda em discordância para termos uma desculpa para nos vermos mais uma vez no boteco e debater em torno do suco de cevada.
Por enquanto, no Brasil, só existe em Porto Alegre, organizado pelo Coletivo Ácido Cético e por nós aqui da LiHS. Mas queremos entusiasmar você a organizar na sua cidade: todos só têm a ganhar! Bem… na verdade alguns podem perder a fé em homeopatia, reiki, conscienciologia, “cura quântica”, astrologia, florais de Bach,
Deus… mas o que são essas besteirinhas frente a ganhar amigos, e amigos inteligentes, e amigos que continuam inteligentes mesmo perdendo alguns neurônios para a cerveja? (Mas tem alguns céticos que nem em cerveja acreditam e ficam só no suco mesmo.)

Aqui está o fruto da nossa experiência de 6 eventos e centenas de participantes: um manual para organizar um SiTP aí na sua cidade:

atheis.me/manual-sitp-1

Bons bares, boas conversas, sempre com bom humor e moderação!

Veja mais fotos como esta em LiHS – Liga Humanista Secular do Brasil

Relato da Participação no World Humanist Congress de Oslo 2011

Por Daniel Martin, diretor de relações internacionais da LiHS (agosto/2011).

Chegada em Oslo
Cheguei no aeroporto da capital norueguesa no domingo a noite, apos uma viagem um pouco cansativa (troca de voo em Hamburgo, Alemanha). Estava chovendo. Logo procurei um meio de transporte para o centro da cidade, e encontrei um trem de alta velocidade que me deixaria na Estação central de Oslo, a alluma quadras do hotel. Nerd confesso, liguei o GPS para saber a velocidade do trem: maxima de 211 km/h. Chegando, comi um sanduiche na estação e fui para o hotel preparar a apresentação e descansar.

A General Assembly 2011

Chegando no local do congresso, fui recebido pelo sr. Colin Divens, que me passou algumas informações: eu iria participar da Assembléia Geral da IHEU, instituição que a LiHS passou a fazer parte em julho deste ano. Tinhamos direito a um assento nesta assembléia. Ele então me passou um documento (em formato eletrônico, em anexo) e a senha para abrir o mesmo. Além disso, me deu um cartão verde, que daria direito a falar na Assembléia, mas não daria direito a voto (o cartão vermelho daria direito a voto). Eu disse também que eu tinha disponível uma apresentação em .ppt, caso fosse me dado à palavra. Ele falou que provavelmente não haveria tempo para esse tipo de apresentação na assembléia, mas se interessou bastante pelo material, que foi posteriormente enviado por e-mail.
A assembléia começa, e apos rapidas apresentações iniciais, segue discudindo questões institucionais e administrativas, além de orientações as instituições-membros.

Topicos discutidos neste dia:

– Constitutional changes discussion and votes · Foi votada a participação de algumas instituições (lista estara disponivel em documento posterior).
· Alguns membros se manifestaram, sobre os seguintes topicos:
§ A taxa de 100 libras, alguns alegam que é caro demais para varios paises. Outros alegaram que é para ser mais flexivel.
§ Quais organizacoes podem fazer parte? Quais os valores a organização deve ter para ser aceita no guarda-chuva da IHEU?
§ Um delegado francês disse que a palavra “Humanista” é generica demais e envolve praticamente tudo, por isso eles nao a usam.
§ A discussao continua, sobre aceitar a instituicao se ela tem ou nao “humanista” ou “ateista” no nome, o quanto isso è importante, etc.. as opinioes, no geral, sao de que o nome nao è tao importante, desde que
os valores estejam alinhados com os valores da IHEU. Sobre esse ponto especifico, houve uma discussão posterior detalhada no proximo topico.
Policy resolutions from the Congress
· Resolucao adotada pelo congresso: combate à corrupção!
§ Durante o congresso, um dos temas mais debatidos foi o combate à corrupção, e os danos causados pela corrupção no sentido de dificultar o acesso das pessoas aos direitos humanos.
§ Sobre esse e outros assuntos, vamos aguardar material posterior. Os contatos criados nascidos dessa nossa iniciativa permitirão o acesso à mais informações.
§ Em todos os topicos questionou-se se alguém gostaria de se manifestar, contra ou a favor. Neste ninguém se manifestou contra.
Resolução: non-religious people in military
§ Delegado da Military Association of Atheists & Freethinkers falou um pouco sobre a realidade enfrentada pelos militares nos EUA, onde é obrigatorio ter capelões no exército.
§ Discutiu-se alguns pontos contra e a favor, principalmente sobre a necessidade do militar de um apoio na horas dificeis.
– Presentation from candidates for election to the EC +
· election by acclamation, ou seja, apenas verificou-se se havia alguém contra:
§ Susan Sackett
§ Ron Solomon
Date and venue of 2012 GA: Friday 2 August 2012 and Sunday 5 August (afternoon), with a
conference on Saturday 3 and morning of Sunday 5 August in Montreal, Canada.
– Alguns pontos que não consegui encaixar nos tópicos acima:
(sei que alguns comentários parecem meio fora do contexto… mas não me levem a mal, foi apenas minha ânsia de querer copiar tudo, ou seja, não perder nenhum detalhe do que estava sendo falado lá).
Alguém levantou a questão sobre o direito de protestar contra a violação dos direitos humanos, nem sempre respeitado e que deve ser garantido (houve uma crítica à ONU, de não citados 3 países membros)
– Algo foi dito sobre a Guerra na Somália (que tem acontecido por muitos anos)
– Outro participante perguntou qual o propósito dessa declaração (durante o congresso foi debatida a criação de um documento onde haviam alguns conceitos, como o conceito de PAZ, HUMANISMO, etc.):
o Foi respondido que a razão principal é ter uma base para, por exemplo, quando uma instituicao usa a palavra PAZ, todos sabem exatamente do que se estao falando.
o (comentário meu: a primeira vista, o tema pode parecer irrelevante. Mas acho extremamente importante o tema, inclusive sugerindo para nós, LiHS, que usemos um pouco do nosso tempo definindo alguns conceitos – a própria palavra HUMANISMO, por exemplo – para quando qualquer um se referir à ela sabermos exatamente do que estamos falando)
– Foi falado das MARCHAS PARA ESTADO LAICO, que acontecerão na Europa, mas que eles não têm números exatos, nem locais exatos. O secretário falou para comparecer nas marchas, enviar datas e numeros de pessoas para o email da IHEU para a divulgação e contagem, diante da dificuldade de obter numeros exatos na maioria dos países. Isso acontece pelo simples fato de que nem todos os eventos humanistas são organizados por instituições ligadas à IHEU. Ao mesmo tempo, é interessante saber que eles estão muito receptivos com
as informações vindas do Brasil.
– Uma senhora falou que há uma iniciativa (nos EUA) de traduzir textos e informações humanistas e seculares, nao so para o Inglês, mas para o Árabe também.
– A presidente encerra a sessão, agradecendo à todos, à um americando chamado Jules, pelos 3 ultimos anos de trabalho (ela comenta o fato dele ser de NY mas morar em Las Vegas…), e pede que visitemos todos os dias o website, para conferir as noticias.

Pós-assembléia

Logo após o fim da assembléia, procurei fazer contatos e conversar com as pessoas. Conversei com a Sonja Eggerickx, presidente da IHEU, com o Colin e mais algumas pessoas. Não foi muito fácil, pois estavam rodeados por todos os delegados ali presentes, cada um disputando a atenção da diretoria.
Tive a oportunidade de falar, à pequenos grupos de cada vez, sobre a nossa situação brasileira: o fato de sermos os grupo mais odiado, do país ser extremamente religioso, das nossas ações como a luta à favor da liberdade de aborto, do combate à homofobia, dia do orgulho hétero, do nosso rápido crescimento (da LiHS), do nosso esforço em divulgar informações e conhecimento, protesto contra apedrejamento, etc.. enfim, falei sobre bastante coisas, o que a memória permitiu falar naquele momento, e graças ao material que eu tinha estudado alguns dias antes.
Algumas coisas que marcaram:
• Como sempre, as pessoas se interessavam e abriam um grande sorriso quando eu dizia que era do Brasil.
• Ao mesmo tempo, todos me falaram da palestra do dia anterior sobre corrupção (Organized Civil Society in Promoting Just Global Governance – The Example of Fighting International Corruption, por Peter Eigen da Transparency International). Aliás, foi falada também durante à assembléia. Triste saber que nosso país é tão atingido por esse mal, mas melhor expor a ferida para poder melhor tratá-la.
• Ainda, discutimos bastante como a corrupção afeta o acesso das pessoas aos seus direitos (desde coisas simples como saúde pública, saneamento básico e educação até infra-estrutura de transporte, moradia e bens de consumo).
Quando eu falei que a Câmara de SP tinha votado um “dia do orgulho hétero”, as reações eram SEMPRE exageradas: gargalhadas, gritos (algo como “WTF??!!?!? Are you kidding me?”) e faces assombradas. As pessoas simplesmente tinham dificuldade de acreditar no absurdo disso.
• O grande número de membros da LiHS e o rápido crescimento deixaram todos com um belo sorriso, bastante impressionados. Disse que era graças ao nosso trabalho sério e transparente, divulgação nos meios eletrônicos. Disse também que uma das nossas missões era levar informação e conhecimento às pessoas, e estávamos tendo bastante sucesso nesse ponto, mas que procuramos trabalhar cada vez mais, afinal é um país imenso, ainda há muito trabalho à fazer.

Depois do evento.

Após o fim dos contatos, quando a maioria das pessoas já havia saído, voltei ao hotel para um descanso, deixar computador e papéis (que acabei nem usando para anotações), troquei de roupa e saí para uma caminhada na cidade, apesar da ainda presente chuva.
Oslo é uma cidade bastante cara (mesmo para padrões europeus), mas é muito bonita, as pessoas são simpáticas (para padrões europeus, haha) e quase todas falam inglês, o que facilitou bastante a comunicação.
Visitei o local onde aconteceram os atentados. Aliás, apenas de longe, pois estava tudo cercado pela polícia, para imagino permitir tranquilidade aos trabalhos. É impressionantemente triste ver isso. Aliás, ficava a apenas duas quadras do local onde foi o Congresso, e algumas janelas do local foram atingidas. Muitos vidros quebrados, mesmo sem vista direta para o local onde estava a bomba, devido ao “reflexo” da explosão.
Não me perguntem o porquê, mas a maioria das homenagens estava sendo feita no pátio de uma igreja (Catedral de Oslo – Luterana) à algumas quadras do local da explosão.
Visitei também o Nobel Institute, onde é entregue todo ano o Prêmio Nobel da Paz, e a sede da Norwegian Humanist Association (Norwegian: Human-Etisk Forbund, HEF), a maior associação Humanista Secular do mundo (estava fechada no dia, por conta do congresso).
A noite escrevi o e-mail para o Colin (mas acabou sendo enviado somente na terça), e agora a pouco recebi (com cópia para a Diretoria da LiHS) a gratificante resposta dele e da presidente da IHEU (copio abaixo), fato que por si só fez valer a pena essa pequena jornada, não só minha, mas de toda a LiHS, ao World Humanist Congress em Oslo 2011.

Anexo: e-mails do Colin Divens e da Sonja Eggerickx:

“Hi Daniel,
Great to meet you in Oslo at the World Humanist Congress; we are really pleased that LiHS was represented there.
Thank you for sending through the very comprehensive and informative presentation on your organisation, as discussed. I have copied Sonja into my reply, so that she can view it too.
As your associate membership application was approved by the IHEU General Assembly in Oslo, LiHS is now an associate member of IHEU, in good standing 2011. Welcome!
Speak soon,
Colin Divens
International Humanist and Ethical Union

(Olá Daniel, foi bom te encontrar em Oslo no Congresso Humanista Mundial; nós estamos realmente felizes que a LiHS foi representada lá. Obrigado por ter mandado a apresentação muito compreensível e informativa, como nós háviamos combinado. Copiei Sonja na resposta, assim ela pode ver também. Como a sua aplicação de membro associado foi aprovada na Assembléia Geral em Oslo, a LiHS agora é membro associado da IHEU, no ano de 2011. Bem-vindos!

Até breve, Colin)

“Thanks! Went quickly through it, sounds great!
Dear Daniel,
I am very happy that LiHS did join IHEU! It means an important step forward in organising the Latin Americans
humanists. It will be an example for others to follow
Sonja”

(Obrigada! Após uma lida rápida, parece muito bom! Querido Daniel, estou muito feliz que a LiHS se juntou à IHEU! Significa um importante passo adiante na organização dos Humanistas Latinoamericanos. Será um exemplo para outros seguirem.

Sonja )