Observações críticas sobre o PL nº 4.211/2012, de autoria do deputado Jean Wyllys

Por CoFem
 

O deputado Jean Wyllys propôs o Projeto n.4.211/2012,
que, se for convertido em lei, se tornará conhecido como ‘Lei Gabriela Leite’.
Diz-se que o projeto visa regulamentar a profissão de prostituta/trabalhador do
sexo.

1) Quem foi Gabriela Leite?

Gabriela Leite foi uma guerreira, uma lutadora que exercia a profissão de
prostituta e dedicou boa parte de sua vida lutando pelos direitos dos
profissionais do sexo. Fundadora da Ong ‘Davida’ e da marca de roupas ‘Daspu’.

2)
O projeto de lei aumentará a prostituição?

Não possuindo poderes especiais, não há como afirmar, com a certeza que se faz
necessária, que isso irá ocorrer, ou seja, que a regulamentação da profissão
aumentará a busca por essa profissão.


O deputado em sua justificativa, afirmou que não:

“…O escopo da presente propositura não é estimular o crescimento de
profissionais do sexo. Muito pelo contrário, aqui se pretende a redução dos
riscos danosos de tal atividade. A proposta caminha no sentido da efetivação
da dignidade humana para acabar com uma hipocrisia que priva pessoas de
direitos elementares, a exemplo das questões previdenciárias e do acesso à
Justiça para garantir o recebimento do pagamento….”

De maneira alguma duvidamos do real intento do deputado; o trabalho dele,
incansável e indispensável, tem mostrado quais os valores que ele de fato tem e
defende. Todavia, muitas vezes nossas ações acabam tendo desdobramentos que
fogem à nosso controle. Entendo esse o caso.

Tendo ou não bola de cristal, todo e qualquer ser humano é capaz de, analisando
os fatos sociais, prever minimamente o que pode vir a ocorrer. E sim, não há
como afastar a hipótese de que isso pode sim ocorrer. Expliquemo-nos:

Existe uma coisa em Direito Penal chamada princípio da reserva legal; dita ele
que não existe crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia
cominação legal.

Significa isso o seguinte: uma determinada conduta SÓ será considerada crime se
tiver uma lei dizendo que aquela conduta específica é crime e só haverá punição
se houver uma lei anterior fixando uma punição para aquela conduta.

Existe uma outra coisa chamada ‘Tipicidade’; ela traduz uma relação entre um
tipo penal (algo definido como crime) e uma conduta humana e que deve haver um
encaixe perfeito entre a definição da lei e a conduta. Se uma conduta não for
típica, ela é ‘um nada’ para o Direito Penal, ou seja: não haverá qualquer punição porque não será considerado crime.

Porque essas duas definiçoes supra são importantes? Sao importantes porque o
projeto do deputado Jean modifica o conceito de exploração sexual. Vejamos o
que diz:

“Art. 2o – É vedada a prática de
exploração sexual.
Parágrafo único: São espécies de exploração sexual, além de outras
estipuladas em legislação específica:
I- apropriação total ou maior que 50% do rendimento de prestação de
serviço sexual por terceiro;
II- o não pagamento pelo serviço sexual contratado;
III- forçar alguém a praticar prostituição mediante grave ameaça ou
violência”

Trocando em miúdos, para ser considerada EXPLORAÇÃO SEXUAL, a conduta tem de se
encaixar perfeitamente em ao menos um dos três incisos. Se tal nao ocorrer,
diga adeus a qualquer possibilidade de penalização do agente.

Como isso reflete nas demais normas penais que tratam do assunto ‘prostituição’?
Vamos ver?

O artigo 228 do CPenal atualmente tem a
seguinte redaçao:

 “Art. 228.  Induzir ou atrair alguém
à prostituição ou outra forma de exploração sexual, facilitá-la, impedir ou
dificultar que alguém a abandone”
e , se o projeto objeto da
presente for aprovado, passará a ter a seguinte redação: “Art. 228. Induzir ou atrair alguém à exploração sexual, ou
impedir ou dificultar que alguém abandone a exploração sexual ou a
prostituição”.

Ou seja: o tipo penal atual foi reduzido em categorias novas.

Antes:
a) induzir ou atrair alguém à prostituição ou a outra forma de exploração sexual,
b) facilitá-la,
c) impedir ou dificultar que alguém a abandone.

Agora:
a) atrair alguém à EXPLORAÇÃO SEXUAL,
b) impedir ou dificultar que alguém abandone a exploração sexual ou a prostituição.



Consegue visualizar a diferença? Não será crime tentar convencer as pessoas a
se prostituírem. Assim, pessoas interessadas em aumentar a oferta de
prostitutas pode contratar uma pessoa para sair por aí, pelos rincões de nosso
Brasil convencendo pessoas a se prostituírem, tentando atrair essas pessoas
para a prostituição. E isso não será crime.

Tá tudo bem para você? Você acha que considerando a grande vulnerabilidade
econômica de muitas pessoas nos recônditos mais distantes dessas terras de
santa cruz, que não será fácil fácil convencê-las a entrar para a prostituição?

Vamos pensar em termos de capital; a Organização Internacional do Trabalho
demonstrou, em seu relatório, os obstáculos impostos às mulheres por conta do
gênero, isso desde a fase escolar até a fase adulta, com recebimento de valores
inferiores aos dos homens pelo mesmo trabalho. Em lugares mais longínquos, onde
a figura do Estado é mais distante, o problema é maior.

Imagine então o que acontecerá com o ‘mercado do sexo’ ofertando mais vagas de
empregos e ofertar essas vagas às pessoas mais vulneráveis economicamente? Isso
pode ou não aumentar a prostituição?

3)
O Projeto ajudará diminuir a exploração sexual?

Em entrevista concedida ao Childhood Brasil, ele, apesar de ter respondido de
forma muito vaga, também acenou neste sentido:

“CB – De que maneira o projeto de lei garante o enfrentamento da
exploração sexual contra crianças e adolescentes?

JW – Apesar de a profissão ser reconhecida, as casas de prostituição são
ilegais. Esse tipo de situação faz com que essas casas não sejam fiscalizadas,
pois operam na ilegalidade, deixando as prostitutas em situação de insegurança
jurídica e longe do acesso aos serviços públicos. Operar na legalidade irá
promover o melhor acesso das prostitutas a políticas públicas, como as do
Ministério da Saúde, por exemplo, na prevenção de doenças sexualmente
transmissíveis. Além disso, as casas serão fiscalizadas, o que irá coibir a
exploração sexual de crianças e adolescentes”

De verdade compreendemos que o Jean Wyllys de fato acredita que a aprovação do
mencionado projeto diminuirá a prostituição infantil. Mas vamos lá: diminuirá
mesmo?

Primeiro que isso soa meio estranho: vamos salvar nossas crianças jogando as
mulheres aos leões? Mas antes que nos me acusem de moralismo, adianto que isso
será tratado mais adiante.

Segundo que: quem fiscalizará? Veja: um projeto de lei passa por várias
comissões: a comissão de constituição e justiça, a comissão de seguridade
social, a comissão de finanças e tributação. Essa última analisa o impacto que
 cada proposta de lei gerará no orçamento. É lóooooogico que esse projeto
do deputado Jean vai passar nessa comissão….afinal, NÃO HOUVE PREVISÃO de
quem será o órgão responsabilizado pela fiscalização dos estabelecimentos. Quem
vai ser?

Veja bem: deixar a encargo da política e acreditar que haverá uma fiscalização
efetiva é ser por demais ingênuo. Afinal, se nós mesmas sabemos onde tem uma
quantidade grande de estabelecimentos que se dedicam a prostituição a polícia não sabe? O que vai acontecer é mais do mesmo: a fiscalização não passará de
desculpa para policiais corruptos tomarem dinheiro dos empresários que exploram
tais atividades.
 

Não que existam apenas policiais corruptos neste país; mas sim que a fiscalização
ou é ineficaz ou inexistente, e quem ignora isso é tolo e ingênuo.



4) O Projeto regulamenta a profissão de prostituta?

Mas vem cá: o que é regulamentar uma profissão? Vamos começar do começo. A Constituição diz que todo trabalho ou profissão é livre. Esse direito à livre
escolha é limitado de algumas formas: a) exemplo do serviço militar, que não é
livre, b) necessidade de qualificação (como advogado, engenheiro, etc).

Quando o Estado regulamenta a profissão, geralmente ele traça diretrizes sobre
a atuação do profissional, fixando direitos, obrigações e deveres. Isso
acontece na iniciativa privada e também na pública. Exemplo da pública temos a
Lei 10.261/68, chamada Estatuto do Servidor Público Civil do Estado de São
Paulo, que fixa direitos, deveres e obrigações do servidor publico estadual.
Exemplo de iniciativa privada temos a lei 12.468/2011 que regulamenta a profissão de taxista, que também fixa direitos, deveres e obrigações.

Já o projeto do Deputado Jean faz o que mesmo? Quais os direitos, deveres e obrigações das prostitutas, fixados na lei mencionada?

a) O direito de criar cooperativas, fixado no artigo 3, inciso II? Oras, não
subestimeis a capacidade de interpretação de outrem! Considerando que a prostituição (a pessoa se prostituir) não é conduta ilícita (proibida pelo
ordenamento jurídico), as prostitutas JÁ teriam o direito de criar cooperativas
de trabalho que seriam reguladas pela Lei 5.764/71. O problema disso é que os
resultados financeiros obtidos seriam distribuídos entre os membros da
cooperativa e a distribuição seria proporcional ao ‘trabalho’ daquele cooperado
‘X’ ou ‘Y’.

b) O direito de trabalhar como autônomo? Bom, isso já é direito da prostituta,
que exerce atividade lícita, que tem sua ocupação descrita no Código Brasileiro
de Ocupações e direito a se inscrever na Previdência como profissional do sexo.

c) O direito a estar dentro da legalidade? Oras, elas já exercem atividade
legalizada.

Que inovação o projeto traz, qual o novo benefício trazido pelo projeto, alguém
pode nos apontar?

Um exercício leve de imaginação (que o deputado Jean Wyllys tem envergadura
intelectual para fazer até melhor) permite que pensemos em coisas que seriam de
interesse destas trabalhadoras. Vamos a elas?

d) Do direito a não se prostituir e do Direito de denunciar e exigir a punição
do cliente que cometa abuso sexual:

 “…Observou-se que as
prostitutas eram solteiras, pertenciam a um grupo socioeconômico desfavorável e
possuíam baixo nível de escolaridade, o que dificultava a inserção das mesmas
em outras atividades comerciais….”

Disso o projeto não trata: como já dito, não existe paridade entre as chances
ofertadas às mulheres e às ofertadas aos homens, no campo do trabalho (como
apontou o relatório da OIT), as mulheres tem muito menos chances. Que tal se o
projeto se preocupasse com políticas que ofertassem às mulheres maiores
possibilidades de escolhas (impedindo que escolhessem a prostituição) e meios
para sair dela. Isso seria muito bem vindo, ou não? Seria de interesse das
próprias prostitutas. Ou não?

“Notou-se também que essas mulheres estão sujeitas à violência, seja por seus
clientes, que entendem que o pagamento lhes confere poderes, até mesmo para
agredi-las, bem como pela sociedade, que as marginalizam como sendo pessoas não
dignas de direitos. Cabe ressaltar como fator preocupante a pouca procura,
enquanto vítimas de violência, pelos serviços jurídico, policial e de saúde,
seja por medo da recidiva das agressões ou pela vergonha. Sendo assim, torna-se
imprescindível a divulgação das ações de apoio realizadas por esses órgãos, a
fim de que as prostitutas exercitem seus direitos.”

Disso o projeto também não trata: de como proteger as clientes de eventuais
abusos dos clientes. Porque a prostituta consentir em sexo anal, vaginal ou oral
NÃO implica em aceitar, consentir com qualquer tipo de dor. E se o cliente
resolver fazê-la sentir dor? E se ele contratar sexo vaginal e forçar sexo
anal? Ninguém se preocupa como a prostituta poderia se proteger disso ou
responsabilizar o abusador? Porque o projeto do Jean, que busca regulamentar a
profissão NÃO trata desse assunto?

O artigo de onde foram tirados os trechos supra descritos estão aqui:

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-71672012000600015&lng=pt&nrm=iso

e) Do direito da prostituta ou prostituto a seus direitos civis e das políticas
públicas a serem implementadas para que o Estado treine seus agentes para
respeitar ditos direitos.

Veja esse texto:

“… Esse conjunto de artigos revela pois que, embora a prostituição não seja
considerada crime, a vigência até os dias atuais do supracitado Código e em
consequência, a criminalização de um conjunto variado de atividades que são
intrínsecas ao seu funcionamento cotidiano, faz do sistema de justiça criminal
uma instituição permanentemente demandada para determinar a existência ou não
de delitos passíveis de serem punidos penalmente. Além disso, a necessidade
constante de se fazer a distinção entre prostituição e lenocínio e que ocasiona
o acionamento das instituições que integram o sistema de justiça criminal, abre
espaço para uma série de ações que, freqüentemente, ferem direitos elementares
das prostitutas quando não as envolvem em situações marcadas pele violência
(Barreto, 1995; Briones, 1995; Pimentel, 1994)…..”

Quem não sabe disso? Vai na Rua Augusta (SP, Capital) ou nas imediações do
Parque do Carmo (também SP) ou em qualquer lugar onde existam prostitutas e
você vai ver que vira e mexe policiais vao lá e desrespeitam os direitos civis
dessas pessoas. Isso é comum como chiclete na calçada. Ignorar isso é ignorar
algo profundamente ordinário nas relações Estado-cidadãos/ãs prostitutos/as.

Onde estão os artigos do projeto que visam isso, políticas públicas para mudar
esse quadro? Não é de interesse das prostitutas?

O texto integral de onde extraímos esse trechinho, está aqui:

f)  Das políticas de saúde voltada às prostitutas:

“…Um dos grandes desafios
enfrentados pelas prostitutas se refere ao convencimento do cliente para o uso
do preservativo. De um lado existe a resistência dele quanto à adoção de
práticas seguras e, do outro, a fragilidade da prostituta ao lidar com tal
situação. Desse modo, além da percepção do risco de infecção por DST/HIV/Aids,
são necessárias habilidades das prostitutas para lidar com as diversas
situações.5 A maior vulnerabilidade envolve o preço e a quantidade de
programas, a autonomia de negociação direta com o cliente e o acesso a
preservativos….”



Esse assunto, saúde pública, é de interesse tanto das
profissionais quanto de toda a sociedade. Quais serão as medidas a serem
implementadas para conscientização dos clientes (da necessidade de medidas
preventivas) e das ações de saúde voltadas para os profissionais.

Link do texto aqui: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-07072008000300003&lng=pt&nrm=iso

Nada disso interessa aos profissionais da área?
Muito duvidamos.

Nenhum desses assuntos foi tratado, o que nos leva a inevitável pergunta:
PORQUE?

Agora, navegando nos obscuros mares das conjecturas, poderia dizer que a) não
existe consenso entre as entidades ouvidas (o que levaria a outra pergunta:
quais entidades foram ouvidas? e considerando as notícias que mostram
discordância entre as próprias interessadas, o porque de algumas opiniões serem
consideradas e outras não)  b) havendo um
forte lobby dos interessados no projeto (indústria da exploração sexual),
existiria uma pressão que tornaria impossível, por hora, tratar desses outros
assuntos sem comprometer a aprovação do projeto  c) o deputado Jean Wyllys está apostando no
utilitarismo de aprovar o projeto deste modo crendo que DEPOIS será possível
emendá-lo para incluir outros aspectos.

O parágrafo supra foi pura conjectura, logo ele pode não revelar a verdade dos
fatos. Mas suponhamos que seja assim. Nenhuma das hipóteses justificaria a aprovação do projeto como está.

A uma
porque enquanto houver dissenso nao será possível dizer, como o deputado
tem dito, que o projeto é de prostitutas para prostitutas.

A duas porque se há lobby do mercado
do sexo fazendo pressao para a aprovaçao do projeto como está, entao o projeto
deve ser revisto, pq a indústria JAMAIS se preocupa com o indivíduo.

A três porque aprovar como está na
esperança de depois poder emendar é ingenuidade. Está aí o PL 122/06 que visa
emendar a Lei 7.116/89 para provar.

O resumo da ópera é que o projeto só beneficia o cafetão, o aliciador, o
agenciador, aquele que explorará o trabalho da prostituta.

5)
Quem é contra o projeto é moralista?

Quem afirma isso aposta na idéia de que as feministas tem problemas com sexo,
quando isso não é verdade.

O problema de muitas feministas com a prostituição reside no conceito de
ESCOLHA.

Uma blogueira conhecida no meio feminista, chamada Fabiane Lima, bem apresentou a
questão, conforme abaixo exposto:


“Sobre
prostituição e escolha

Que tal se, nessa discussão — em que vivem acusando feministas que são contra a
prostituição de serem moralistas — em vez de a gente falar em “moral” a gente
falar em “capital”? Porque assim, se vocês não vêem nada de errado em 95% das
pessoas prostituídas serem mulheres [cis ou trans, tanto faz], nem notarem que
é até estranho usar essa palavra no masculino, nem que mesmo entre os poucos
homens que se prostituem a maioria está ali para servir outros homens, acho que
é bom a gente mudar o foco do debate, só um pouquinhozinho assim.

Convido vocês então a darem uma olhadinha em umas coisinhas:

Mulheres são donas de MENOS DE UM PORCENTO da propriedade privada no mundo, e
geralmente quando o são, o receberam por herança [DEERE e LEON, 2001].
Mulheres foram [e são] historicamente excluídas do processo de geração do
conhecimento [SCHIEBINGER, 2001].
Em alguns lugares do mundo, é mais fácil uma menina ser estuprada que ser
alfabetizada [BANYARD, 2010].
Mulheres foram [e são] historicamente excluídas da educação formal, e mesmo
quando admitidas em escolas e universidades, esse acesso foi bastante restrito
durante muito tempo — ainda é em muitas áreas, como por exemplo a computação
[ETZKOWITZ et al, 2000].
Sempre que um campo começa a se profissionalizar, tal campo, que antes era
aberto e receptivo à presença feminina — mão de obra barata, quem não quer? —,
passa a se masculinizar progressivamente. Isso aconteceu com TODOS os campos do
conhecimento, e com TODAS as atividades profissionais, da astronomia à
computação [SCHIEBINGER, 2001; CARVALHO, CASCAES & SPANGER. In: CARVALHO et
al., 2009].
Mulheres foram, principalmente durante os primeiros séculos da criação do
sistema de patentes, ridicularizadas quando tentavam registrar alguma invenção
sua [MCGAW. In: LERMAN et al, 2003], num sistema que já tem sérios problemas em
relação a atribuição de autoria [NOBLE, 1979].
Mulheres, quando trabalham em uma certa área em que sua atuação é vista como menos
importante, acabam não recebendo créditos por sua participação [LIMA e MERKLE,
2013 <= EUZINHA].
Mulheres, durante toda a vigência do patriarcado são hiperssexualizadas e
vistas como mero objeto de decoração, objeto de meter a rola dentro, porque
mulher não pode pensar, não pode se impôr, não pode bosta nenhuma além de parir
e ser linda [DINES, 2010].
Esses são apenas alguns exemplos. Então pensem aqui comigo: as mulheres são
excluídas da posse de bens materiais desde que a noção de bens materiais existe
[há aproximadamente cinco mil anos, vide ENGELS, 1984], e de repente, vender a
única coisa que elas de fato têm, a si mesmas, assim, de repente, virou uma
ESCOLHA delas? Gente, como assim? É sério isso?

Homens botam um monte de barreiras pro acesso das mulheres em tudo que é área
que possa garantir o sustento das mulheres e, de repente, não mais que de
repente, vender seu corpo é lindo, é maravilhoso. E essa homarada que acha isso
tudo muito lindo nunca pensou em fazer isso também? Por que será? Ah, já sei! É
porque o leitinho das crianças de vocês já tá garantido, né?
___________________________

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BANYARD, Kat. The equality illusion : the truth about women and men today. London:
Faber and Faber, 2010.

CARVALHO, Marilia Gomes; CASCAES, Tânia Rosa F.; e SPANGER, Maria Aparecida
Fleury Costa. “Ciência e Tecnologia sob a Ótica de Gênero”. In: CARVALHO,
Marília Gomes de; CASAGRANDE, Lindamir Salete; e LUZ, Nanci Stancki da (org).
Construindo a Igualdade na Diversidade: gênero e sexualidade na escola.
Primeira edição. Curitiba: Editora UTFPR, 2009.

DEERE, Carmen D. e LEÓN, Magdalena. Empowering Women: land and property rights in Latin America. Pittsburgh:
University of Pittsburgh Press, 2001.

DINES, Gail. Pornland : how porn has hijacked our sexuality. Boston: Beacon
Press, 2010.

ENGELS, Friedrich. A Origem da Família, da Propriedade
Privada e do Estado. Nona edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1984.

ETZKOWITZ, Henry; KEMELGOR, Carol e UZZI, Brian. Athena Unbound: the advancement of women in science
and technology.
Cambridge: Cambridge University Press,
2000.

LIMA, Fabiane Alves de; MERKLE, Luiz Ernesto. “O processo de invisibilização
das mulheres na informática e na produção tecnológica a partir do exemplo das
ENIAC Girls”. Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos),
Florianópolis, 2013.

SCHIEBINGER, Londa. O Feminismo Mudou a Ciência? Tradução de Raul Fiker. Bauru:
EDUSC, 2001″

Apesar
do texto dela ser auto-explicativo, vamos resumir ainda mais: A Fabiane Lima
analisa o contexto econômico no qual estão inseridas as mulheres brasileiras e
tenta mostrar ao interlocutor a questão da escolha sob outro prisma. O Estado
Brasileiro tem de cumprir com as diversas obrigações que assumiu na ‘Convenção
para eliminação de todas as formas de discriminação contra as mulheres’. Sério,
cumpram aquilo pois, quando todos aqueles artigos ganharem EFETIVIDADE, daí
sim, poderemos falar em ESCOLHAS. Porque enquanto as mulheres tiverem de
enfrentar os obstáculos descritos no relatório da OIT e na pesquisa da Avon, não há de se falar em ‘escolha válida’, pois quando a escolha é SÓ UMA, não há,
de verdade, escolha alguma.

“….Nós vivemos numa sociedade consumista/de consumo onde a prioridade
vai para o individualismo e para o consumo irrestrito de pessoas e coisas, e
baseado no consumo um dos outros. Em tal contexto, ver prostitutas como
trabalhadoras serve para encobrir a oposição feminista ao marketing de mulheres
numa escala global. Isso permite os cafetões afirmarem que mulheres fazem isso
por ‘escolha’, e mesmo por ‘gosto’, então escondendo o que todos estudos
demonstram: que mulheres prostituem a si mesmas por necessidade¹….”

“…..Muitos dos que argumentam
pela liberação total da prostituição tentam descreditar feministas que são
opostas a essa posição dizendo que em última instância são moralizante, seus
discursos, portanto, vitimizantes e estigmatizantes das prostitutas. Todavia,
neo-abolicionistas não são responsáveis pelas condições de trabalho das
prostitutas ou pela hostilidade daqueles que vêem sua vizinhança transformada
num mercado aberto de mulheres e drogas. Por que nós não temos sido aptas a
extirpar as causas do problema, devemos legitimar suas conseqüências?

A íntegra do texto de onde tirado esses trechos você encontra aqui: http://arttemiarktos.wordpress.com/2010/11/20/prostituicao-direitos-das-mulheres-ou-direitos-sobre-as-mulheres/

Então, falar em moralidade é uma forma rasa de desviar o verdadeiro cerne da
discordância de muitas feministas, que é na contestação da ‘escolha’ dessas
mulheres. Quando e se todas as mulheres tiverem reais, válidas e equânimes
escolhas profissionais, será então possível falar em escolha sem ignorar que a
maioria não tem escolha alguma.

 

6)
Do direito de escolha de quem não é levado pelas condiçoes socio-econômicas:

“…..É essa a imagem de
“prostituta respeitável” que os políticos querem tornar plausível: livres para
fazer o que elas gostam, cobertas pelo sistema de seguro social, fazendo o
trabalho que gostam e poupando numa conta do banco local. Os cientistas sociais
tem um nome para elas: “trabalhadoras do sexo migrantes”; ambiciosas
prestadoras de serviço que estão aproveitando as oportunidades que agora
existem numa Europa cada vez mais unificada…..”

Íntegra do texto: http://arttemiarktos.wordpress.com/2013/10/14/desprotegidas-como-a-legalizacao-da-prostituicao-falhou/

Existem mulheres que entram para a prostituição sem terem sido levadas a ela
por questões econômico sociais, que entraram ‘por gosto’. Sim, existem. São
elas a regra ou a exceção? Todos sabemos que são a exceção.
 

Então é lícito perguntar porque basearíamos a regulamentação de toda uma gama
de profissionais utilizando como base para essa regulamentação APENAS E TÃO
SOMENTE as necessidades da ‘exceção’, ou não?

Citaremos
apenas um exemplo: porque o projeto 7382/2010 (no rodapé consta a íntegra) que
visava penalizar a discriminação contra heterossexuais era TÃO IMENSAMENTE
RIDÍCULA? Porque eventual discriminação de heteros é tao exceção que não
constitui problema efetivo a ser enfrentado pelo Estado e coibido com a promulgação de leis.

Então porque um projeto de Lei como o do
Jean, que baseia-se na escolha, escolha esta que é uma exceção à regra da prostituição, não mereceria a mesma repulsa social?

Fica aí a pergunta para ser respondida por quem teve a paciência de ler tudo
isso.

___________
Íntegra do projeto: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1012829

Íntegra do Código Penal: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm

Íntegra da entrevista concedida por Jean Wyllys ao Childhood: http://www.childhood.org.br/para-deputado-regularizacao-da-prostituicao-pode-coibir-exploracao-sexual-de-criancas-e-adolescentes

Íntegra do texto de Fabiane Lima ‘Sobre prostituição e escolha’: http://euescolhifornicar.com/post/69199073962

Íntegra da Convenção para eliminação de todas as formas de discriminação contra
as mulheres: http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/instrumentos/discrimulher.htm

Íntegra do relatório da OIT: http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/topic/gender/pub/igualdade_genero_262.pdf

Íntegra da Pesquisa do Instituto Avon: http://www.institutoavon.org.br/wp-content/uploads/2013/12/Pesquisa-Avon-Instituto-Ipsos-2013.pdf

Nota sobre postagem no Facebook da LiHS

Gostaríamos de deixar claro que
nós do CoFem não temos envolvimento com a postagem lesbofóbica postada na
página da LiHS/Facebook, no dia 07/12/2013 (retirada no mesmo dia).
  
As
postagens na página do Facebook são feitas de forma independente por vários
diretores da Liga, sem programação e/ou consulta prévia por pares, contando
apenas com o bom senso e comprometimento do postante com o que a entidade
representa.
 

Também
informamos que não compactuamos com a crítica lesbofóbica desferida pelo autor da
postagem. Respeitamos todas e quaisquer formas das mulheres se organizarem
politicamente e não entendemos o lesbianismo separatista, citado pela vertente
radical do feminismo, como ameaça ao humanismo e/ou a dignidade do ser humano.
 
Informamos ainda,
para maiores esclarecimentos, que esse Conselho vem debatendo o caso com outros
diretores da LiHS na esperança de que esta se responsabilize e se retrate.

Pedimos a todas as mulheres que se sentiram incomodadas com alguma
postagem da Liga, que entrem em contato conosco através do e-mail: cofem@ligahumanista.org.br

Qual a sua posição sobre a descriminalização do aborto*?

Por CoFem – LiHS

O termo “aborto”* é aqui utilizado como a
interrupção da gravidez até a décima segunda semana, que é a proposta dos
grupos de lutam pela descriminalização do aborto no Brasil. A proposta é até a
décima segunda semana, porque até este período que o sistema nervoso ainda não
está formado. Por esta razão, o próprio Conselho Federal de
Medicina (CFM) recentemente também se posicionou a favor desta medida
.

O que é?
Esta é uma chave dicotômica delineada para chegar
ao âmago das diversas opiniões sobre a descriminalização do aborto – as suas
consequências diretas. Chaves dicotômicas são um meio comumente usado na biologia
para se chegar à identificação de espécies. Elas funcionam com a indicação
sucessiva de características, que devem ser determinadas pelo leitor, e levam à
identificação da espécie, que é depois confrontada com uma diagnose, para ver
se se chegou na espécie certa. Esta chave propõe a reflexão a respeito de sua
opinião sobre a descriminalização do aborto, com uma “diagnose” das consequências destas opiniões. Porque
ao concordar com uma opinião, você automaticamente precisa entender e concordar
com as consequências dela; caso contrário, ela não é a sua opinião de verdade,
e você está apenas repetindo o que ouviu sem pensar.
Instruções de uso:
Comece pelo número (também chamado de passo) (1) e vá
respondendo às perguntas de acordo com o que pensa. Siga os números
correspondentes às suas respostas, mesmo se a sua resposta te mandar pular
números – é assim mesmo que a chave funciona. Leia todo o texto correspondente
a cada número se quiser compreender as consequências do seu pensamento. Se você
chegou a um ponto que começa com a palavra OPINIÃO, não existe mais direcionamento para outro número,
você chegou ao final da chave, com o diagnóstico de seu pensamento sobre a
criminalização do aborto. Os números entre colchetes correspondem ao número
(passo) da chave que te levou até lá. Exemplo: se está escrito (3) [2], é porque
você está no passo (3), ao qual chegou a partir do passo (2). Isto
facilita retornar ao passo anterior, caso você mude de idéia no meio do caminho
ou tenha se distraído, indo para o passo errado. Caso tenha curiosidade de ver
quais são os outros tipos de pensamento, volte para o número (1) e siga a chave
respondendo às perguntas de forma diferente.
INÍCIO





(1) Você acha que o aborto deve ser crime em QUALQUER situação? 
NÃO, eu acho
que existem situações nas quais o aborto não deve ser considerado crime:
Vá para (2).

SIM:

Vá para (7).
(2) [1] Você acha que existem situações nas quais o aborto
não deve ser considerado crime. Há diversas opiniões dentro deste grupo, desde
bastante restritas, até aquelas que defendem que as situações nas quais o
aborto não deveria ser crime englobam todas aquelas nas quais a mulher não quer
estar grávida.
Se você acha que existem apenas algumas
situações particulares nas quais o aborto deveria ser permitido, e outras não,
vá para
(3). Isto inclui opiniões nas quais o consentimento do
marido/namorado/parceiro é fundamental na decisão de descriminalizar o aborto.
Se você acha que o aborto deveria ser
descriminalizado em
QUALQUER situação na qual a MULHER assim desejasse, a despeito da
opinião do marido/namorado/parceiro, vá
para
(6).
 
Se você pensa que mulheres que praticaram aborto a despeito da opinião do marido/namorado/parceiro não devem ser presas APENAS se engravidaram
em caso de estupro, e/ou no caso de fetos anencéfalos ou com outras
deformidades incompatíveis com a vida, e/ou de gravidez de risco, vá para
(4). 
Se você acha que as mulheres que praticaram aborto
não devem ser presas APENAS em caso de estupro, e/ou no caso de fetos
anencéfalos ou com outras deformidades incompatíveis com a vida, e/ou de
gravidez de risco, mas
se, e
somente se, houver o consentimento do marido/namorado/parceiro, vá para
(5).
(3) [2] As pessoas
podem ser a favor da descriminalização do aborto apenas em situações
específicas por várias razões, ou por diferentes combinações destas várias
razões. Entretanto, as justificativas de algumas das razões mais comuns têm um
mesmo fundamento, e por isso algumas delas foram agrupadas.
(4) [3] OPINIÃO
Você admite que a vida não é um
direito absoluto, que existem situações nas quais é mais razoável que outras
questões possam ser priorizadas. Esta opinião não é exclusividade daqueles que
defendem a não criminalização do aborto em alguma(s) situação(ões). Ela é
compartilhada por todos aqueles que defendem: (i) o direito à legítima defesa,
(ii) a pena de morte, (iii) o direito à autorização de doação de órgãos por
parte de parentes (quando da morte cerebral de alguém próximo), (iv) a
descriminalização do aborto em qualquer
situação. Sua opinião é, portanto, mais próxima daquela defendida por quem
advoga a total descriminalização do aborto, do que daquela dos que querem todos
os tipos de aborto criminalizados.
O direito ao aborto legal e
seguro somente nos casos mencionados (caso de estupro, e/ou no caso de fetos
anencéfalos ou com outras deformidades incompatíveis com a vida, e/ou de
gravidez de risco) é derivado do sentimento, por parte do emissor desta opinião
(você), de que não seria justo obrigar alguém a se submeter a situações que
ele(a) próprio(a) considera horrendas. O
que importa, portanto, é o que o(a) emissor(a) desta opinião considera
aceitável e inaceitável
. Em um exemplo hipotético, o fato de uma mulher
poder considerar catastrófico o suficiente o fato de ter engravidado aos 19
anos, sem nunca ter desejado, estando desempregada, e tendo recém-descoberto
que o namorado é procurado pela polícia, não impressiona quem partilha desta
opinião. Porque o direito à vida é relativo, mas é o emissor da opinião, e não
a protagonista da história, quem determina o quão relativo.
No caso de estupro, por exemplo.
Para os defensores desta opinião, estupro é uma situação horrenda o suficiente
para considerar que a vida de um embrião resultado deste crime pode ser tirada
em favor do bem estar psíquico da vítima. Forçá-la a carregar um feto com
deformidades incompatíveis com a vida, também. A vida destes embriões e fetos é
passível de ponderações quanto a um direito maior: a dignidade da mulher. Mas a
vida daqueles concebidos em situações que os defensores da opinião não
consideram horrendas, não. Cria-se, portanto, uma categorização do valor de
vidas, na qual algumas são passíveis de questionamento quanto ao seu direito de
viver, e outras não. Tudo, é claro, de acordo com o que você, e não a
protagonista da história, determina como aceitável ou não. Lembrando que você
sequer é coadjuvante nisso tudo. Aliás, nem figurinista.
Devido à defesa da relatividade
no direito à vida, a única variável
que difere a sua opinião daquela descrita no passo (6) desta
chave (a não criminalização do aborto em QUALQUER situação na qual a MULHER
assim deseje) é que você pensa que é você
quem deve determinar quando é ou não é razoável que qualquer mulher possa ter
um aborto legal e seguro, se assim decidir. A opinião dela a este respeito é
total e completamente irrelevante. É a sua
opinião, a de um(a) estranho(a) que não a conhece, e tampouco as circunstâncias
e consequências da gravidez para esta mulher, a que vale a respeito de algo que
acontece dentro dela, e que irá afetar a vida dela (e não a sua) para sempre.
Além desta, existem outras
implicações profundas neste tipo de pensamento, e uma boa maneira de
compreendê-las é examinando uma das outras situações nas quais se admite que o
direito à vida é absoluto: a legítima defesa.
Legítima defesa pressupõe perigo
iminente no qual é considerado lícito ao atacado matar o agressor, se for a
única maneira de salvar sua vida. O aborto em casos de risco de morte para a
mulher é tido como análogo à legítima defesa, já que se trata de uma vida
colocando outra em risco. Por isso que até mesmo alguns líderes religiosos de igrejas notoriamente anti-aborto
toleram esta exceção para a criminalização da prática. Entretanto, conforme
apontado por vozes discordantes, a analogia não é de todo válida, uma vez que
não há intenção por parte do embrião/feto de trazer risco de morte à mãe. De
fato não há. E não há porque não pode haver. Porque embriões e fetos com até doze
semanas não têm intenções. Não têm aspirações. Não têm opiniões e nem desejos.
Simplesmente porque não têm sistema nervoso formado.
O fato de um embrião ou feto não
ter intenção de colocar a vida da mãe em risco (dolo, em termos jurídicos) é
interpretado por alguns como justificativa para que o aborto seja criminalizado
mesmo nestes casos. Isto significa aceitar que a proteção a uma vida que é
absolutamente incapaz de subsistir fora do útero no qual se originou, que não
possui sequer sistema nervoso, mas que é capaz de matar a vida que a está
gerando (às vezes causando a morte de ambas) é MAIS IMPORTANTE que a proteção da vida de uma mulher adulta, com
sistema nervoso, com intenções, aspirações, opiniões e desejos. Repare que eu
não disse “tão importante quanto”. Eu disse MAIS IMPORTANTE. Porque
se trata de uma assimetria insolúvel – as duas vidas têm a capacidade de acabar
uma com a outra, e a criminalização do aborto em casos de gravidez de risco dá
a somente uma delas o direito de fazê-lo – ao embrião/feto.
Por outro lado, aceitar que uma
vida inteiramente dependente de outra, sem sistema nervoso, e que coloca a vida
desta outra em risco, tenha o direito de ser terminada por esta abre um
precedente inquietante. Significa reconhecer que se considera que
a vida já formada tem precedência sobre a que ainda está se formando, se ELA
assim desejar.
É preciso, portanto, escolher um lado: ou se admite
que uma vida em formação deve ser protegida pelo Estado mesmo sob o risco de acabar
com uma vida já formada, ou se admite que a vida já formada deve ter o poder de
decidir se ela pode ter precedência sobre a vida que se forma dentro de si.
Existe uma consequência em comum
desta opinião com aquela que defende a criminalização do aborto em todo e
qualquer caso: a de que abortos sempre
foram e sempre serão feitos, sendo seguros ou não, legais ou ilegais
. Esta
não é uma defesa do aborto, é a constatação de um fato. E a outra parte deste
fato é que quem tem dinheiro faz aborto seguro; quem não tem, corre o risco de
morrer ou ser presa (a
mulher, é claro, não existe penalização alguma para o homem co-responsável pela
gravidez).
Se você mudou de idéia e agora
acha que o aborto deve ser criminalizado inclusive nos casos aqui mencionados,
volte para o passo (1). Se você mudou de idéia e acha que talvez o aborto
não deva ser criminalizado, também volte para o passo (1). Se você
está satisfeita(o) com esta diagnose, ótimo, porque ela acaba aqui.
(5) [3] OPINIÃO
Esta opinião engloba diversas
visões sobre quando (ou se) o aborto deveria ser legal e seguro, tendo todas
elas em comum a alegação de que o co-responsável pela gravidez, o homem
envolvido, deve necessariamente ser
ouvido na decisão de abortar ou não. Por englobar diversas visões, é
recomendado que quem defenda esta posição também leia as demais que te definem:
se você defende a descriminalização em todos os casos, desde que haja o
consentimento do homem envolvido, leia também (6); se você defende alguns, leia também (4); e se não
defende em nenhum, depois de ler aqui vá para (11).
Você acha que, se o embrião não
se formou sozinho, os dois responsáveis por sua formação devem necessariamente
ser consultados sobre o que será feito. Esta é uma posição ingrata, já que, se
há concordância entre as partes, a consulta é inócua; e se não há, restam três
alternativas: (i) dar-se por vencido; (ii) tentar convencer a outra parte; e
(iii) se (ii) não funcionar, coagi-la a fazer o que você quer. Dado que nenhuma
tática convencimento tem resultados garantidos, fiquemos com o que resta ao ver
esta possibilidade falhando: dar-se por vencido e a coação.
A primeira é equivalente a
aceitar que a opinião do homem envolvido não é tão importante quanto a da
mulher envolvida, enquanto a segunda é aceitar que a opinião do homem envolvido
é mais importante que a da mulher envolvida. Não existe meio termo quando há divergências sobre o que fazer. Ou
é a mulher quem decide, ou é o homem. Dado que a gravidez ocorre na mulher, se
a decisão que prevalecer for a masculina, será necessária uma vigilância
constante sobre a mulher a partir do momento da descoberta da gravidez, para
que ela não faça nada que vá contra a decisão do homem (aborte caso ele queira
o filho, ou mantenha o filho caso ele não queira tê-lo). Dado que é
completamente indecente alguém ter o
direito de vigilância sobre uma pessoa adulta em posse de suas faculdades
mentais, resta aos homens que querem ter filhos encontrar uma mulher que também
queira, e aos que não querem, utilizar com sabedoria os métodos
anticoncepcionais disponíveis, sabendo
que existe a possibilidade de falharem
.
Outra consequência da necessidade
do aval masculino seria a impossibilidade de aborto legal nos seguintes casos:
gravidez fruto de uma relação sexual casual, na qual o homem não seja mais
encontrado; gravidez decorrente de homem que nega a paternidade (considerando
que até que a justiça o obrigue a fazer teste de DNA, a gravidez já estará
avançada demais para que o aborto seja uma opção); gravidez resultante de
relação sexual com um homem falecido após a concepção.
(6) [2] OPINIÃO
Você é a favor do direito de
TODAS as mulheres (e não somente as que têm dinheiro para pagar) praticarem um aborto
seguro até a décima segunda semana de gravidez se assim desejarem,
independentemente de quais forem as razões ou da opinião de terceiros,
inclusive do namorado/marido/parceiro. Você reconhece que o direito à vida não
é absoluto, ou seja, que existem situações nas quais é mais razoável que outras
questões possam ser priorizadas. Esta opinião não é exclusividade daqueles que
defendem a não criminalização do aborto nestes termos. Ela é compartilhada por
todos aqueles que defendem: (i) o direito à legítima defesa, (ii) a pena de
morte, (iii) o direito à autorização de doação de órgãos por parte de parentes
(quando da morte cerebral de alguém próximo), (iv) a não criminalização do
aborto em algumas situações.
Entretanto, você difere dos
últimos por privilegiar a única pessoa diretamente relacionada com a formação
de uma vida dentro de si como protagonista da decisão de mantê-la ou não,
quaisquer que sejam as razões. Esta visão sobre a criminalização do aborto pode
derivar de várias combinações dos seguintes fatos (geralmente de todos eles
juntos):
a) Autonomia da grávida na
decisão do que fazer. Isto significa que uma avaliação de não estar preparada
para ter um filho é suficiente para tornar legítima a decisão de privilegiar o
seu bem estar e as consequências de ter um filho em uma situação desfavorável,
em detrimento de uma vida que se forma.
b) Acreditar que NINGUÉM deve ter
o poder de impor sua opinião a respeito de algo que ocorre DENTRO do corpo de
uma mulher. Este ninguém vai desde (i) religiosos tentando impor os seus
dogmas, a (ii) desconhecidos tentando (mesmo que inconscientemente) tornar a
maternidade uma punição pelo
descuido da mulher (o homem
co-responsável pela gravidez sequer é mencionado neste tipo de comentário), e
(iii) homens que se vêem despidos de poder para controlar algo que pode vir a
lhes interessar. Para entender mais sobre (i), vá para (8). Para ler algo sobre
(ii), vá para (4). Se quer saber mais sobre (iii), vá para (5).
c) Reconhecer que o aborto é uma realidade (seja
por estupro, ou falhas intrínsecas, derivadas do uso errôneo, ou mesmo do não
uso de métodos anticoncepcionais), e que é
inaceitável que quem tenha dinheiro possa fazê-lo em condições seguras,
enquanto quem não tem precisa conviver com o risco de morrer ou conviver com
sequelas
. Esta constatação pode ser resumida na frase de ver como era e quem disse.
Geralmente este reconhecimento vem com a compreensão de que educação sexual é a
única maneira de prevenir gravidez indesejada (e, consequentemente, abortos).
      (7) [1] Mesmo se
essa pessoa for você mesma ou sua esposa/filha/mãe/irmã, que engravidou em uma
situação horrenda e/ou que corre risco de morrer por causa da gestação, e/ou
que está esperando um filho anencéfalo ou com deformidade severa que não tem
QUALQUER possibilidade de viver mais que alguns dias entubado? 
     
   
·    SIM:
    vá para
(8)
·       
Hm,
talvez NÃO:
    vá para
(9)
(8) [7] OPINIÃO:
Você acha que a vida humana começa na concepção e
que ela é sagrada, literal ou
figurativamente. Ou seja, ela não pode jamais ser tirada, e um óvulo fecundado
tem exatamente o mesmo direito à vida
que você e todos os outros seres humanos viventes.
Estes postulados têm algumas
consequências óbvias, além da criminalização do aborto em todos os casos.
Dentre elas, a de que a vida é um direito absoluto (é uma posição
inconciliável, portanto, com legítima defesa, eutanásia, ortotanásia, suicídio
e a doação de órgãos). Mas há também outras consequências que derivam
diretamente deste pensamento:
a) a de que existem razões
filosóficas, científicas e morais sólidas para considerar um indivíduo
biológico unicelular dotado dos mesmos direitos que qualquer um de nós.
Obviamente estas razões não podem ser religiosas, uma vez que isto seria impor dogmas de sua religião a
terceiros.
Exemplo 1 (se você é
homem): se o que o motiva ser a favor da criminalização do aborto é a crença de que a alma já está
presente no óvulo fecundado, então a sua razão é puramente religiosa e não
pode, portanto, ser imposta a ninguém. A existência de uma alma nos humanos é
inverificável, e é, portanto, matéria de fé. Sua liberdade de crença é direito
garantido pelo Estado, e, portanto, se você pudesse engravidar, seria direito
seu manter a gravidez por esta razão. Mas você não pode, de modo que a sua
crença a este respeito é total e absolutamente inócua, a não ser que você tente
proibir a criminalização do aborto. Aí você estará claramente tentando IMPOR a
sua crença a todas as mulheres. Algo que é, portanto, inconstitucional, além de
ser uma atitude execrável sob qualquer ponto de vista. Tenha um mínimo de
decência em admiti-lo procure saber por que o Estado laico é necessário (para
protegê-lo de pessoas como você mesmo, só que querendo impor outras crenças que
não a sua).
Exemplo 2 (se você
é mulher): se o que a motiva ser a favor da criminalização do aborto é a crença de que a alma já está presente
no óvulo fecundado, então a sua razão é puramente religiosa e não pode,
portanto, ser imposta a ninguém. A existência de uma alma nos humanos é
inverificável, e é, portanto, matéria de fé. Sua liberdade de crença é direito
garantido pelo Estado, e portanto se você decidir manter uma gravidez por esta
razão, é direito seu. Mas OBRIGAR que outras façam o mesmo porque não seria
condizente com a SUA fé praticar um aborto, não é. Isto é IMPOR a
criminalização do aborto para TODOS por causa da SUA fé e é, portanto,
claramente inconstitucional, além de ser uma atitude execrável sob qualquer
ponto de vista. Tenha um mínimo de decência em admiti-lo procure saber por que
o Estado laico é necessário (para protegê-la de pessoas como você mesma, só que
querendo impor outras crenças que não a sua).
b) a de que tomar a pílula do dia
seguinte é equivalente a qualquer tipo de assassinato triplamente qualificado,
ou seja, por motivo fútil, sem dar chance de defesa à vítima, e por meio cruel,
e que deve, portanto, ser equiparado a crime hediondo (assim como o aborto até
12 semanas ou em qualquer intervalo entre a fecundação e as 12 semanas);
c) a de que TODAS as mulheres que
sofrerem um aborto supostamente espontâneo devem ser minuciosamente
investigadas para que seja determinado se foi mesmo como dizem. Há vários
estudos que mostram que existem fatores evitáveis que causam abortos
“espontâneos” (como tomar qualquer remédio que possa vir a afetar um
embrião que pode estar lá, fumar, ingerir álcool e cafeína, etc.). Uma vez que
a correlação entre abortos “espontâneos” e estas drogas foi
corroborado, não existe o direito de alegar desconhecimento no assassinato de
uma pessoa, daí a necessidade de investigação. Portanto, é necessário proibir o
fumo e a ingestão de álcool e cafeína para TODAS as mulheres em idade
reprodutiva que estejam tendo relações sexuais com homens. A diferença é que o
homicídio nos casos em que a mulher ainda não descobriu que está grávida não
seria doloso (com intenção de matar), mas culposo, e portanto a pena seria
menor. Além disso, qualquer pessoa ciente de que uma mulher em idade
reprodutiva que mantém relações sexuais frequentes com homens fez uso de qualquer
das substâncias que sabidamente causam abortos “espontâneos”, e que
não tenha avisado à polícia sobre o fato, deve ser denunciada como cúmplice no
homicídio. É mais ou menos esta lógica que está sendo aplicada em El
Salvador
.
A
continuação da diagnose desta opinião difere em relação ao seu sexo:
Você é
mulher? Você defende que terceiros têm todo o direito de legislar sobre consequências
de crimes abomináveis cometidos contra você e TODAS as demais mulheres
(gravidez resultante de estupro); que terceiros têm o direito de te
obrigar, e
a TODAS as demais mulheres, a continuar em uma gestação que pode levar à sua
morte; e também de te obrigar, e
a TODAS as demais mulheres, a continuar em uma gestação que invariavelmente
resultará em um recém nascido que passará no máximo alguns dias entubado. Se as
razões são religiosas, não se esqueça que nem todas as mulheres que você ajudou
a obrigar a manter a gestação em nome do que a SUA fé diz não a compartilham.
Ou seja: você está obrigando
alguém a seguir o que a SUA fé diz.
Você é
homem? Você defende que terceiros têm todo o direito de legislar sobre
consequências de crimes abomináveis cometidos contra TODAS as mulheres. Suponha
que estejamos falando de sua filha, irmã, mãe, ou namorada/esposa. Vamos dizer
que seja sua esposa. É de se supor, então que, se foi gravidez resultante de
estupro você assumirá parte da responsabilidade na criação da criança que
ajudou a
obrigá-la a ter; afinal, não seria nada razoável obrigá-la a ter uma criança e depois obrigá-la a colocar para adoção. Ou mesmo obrigá-la a ter a criança e se separar por causa
disso, se não tem a menor intenção de criar um filho que não é seu.
Ou então
vamos dizer que seja sua filha. Suponho que está preparado pelo menos para
auxiliá-la financeiramente até a independência de seu neto (já que você não
está em posição de oferecer apoio psicológico, uma vez que fez coro para ajudar
a
obrigá-la a manter uma gravidez indesejada), e já que não é razoável obrigá-la
a colocá-lo para adoção. Isto vale para
todas as formas de parentesco/relacionamento com a mulher em questão, já que
você tem uma parcela de responsabilidade por ela ser obrigada a isso. 
           
A última conclusão desta diagnose é a mesma daquela do passo (4):
abortos sempre foram e sempre serão feitos, sendo
seguros ou não, legais ou ilegais. Esta
não é uma defesa do aborto, é a constatação de um fato. E a outra parte deste
fato é que quem tem dinheiro faz aborto seguro; quem não tem, corre o risco de morrer ou
ser presa
(a mulher, é claro, não existe penalização alguma para o homem
co-responsável pela gravidez).
(9) [7] Você é um(a) hipócrita. Entenda: não podem existir categorias de pessoas que podem fazer
algo, enquanto outras não são proibidas de fazer esta mesma coisa. Ou o aborto
dá cadeia para todo mundo que participar dele (aí há variações nas opiniões a
respeito de em quais situações dariam cadeia), ou não é. Mas não se exaspere,
você definitivamente não está sozinha(o) em sua hipocrisia. TODA a discussão a
respeito da descriminalização do aborto gira em torno do fato de que, para quem
tem dinheiro, o aborto é, na prática, descriminalizado (seguro e sem sequelas).
Caso você esteja em dúvida sobre
o que pensar, percorra a chave inteira, ela não é muito grande.
FIM
Mantenha-se informada (o) sobre o
que está acontecendo no país em relação à legalização do aborto. Leia aqui, aqui, aqui, aqui  e,
principalmente, sobre oque se trata o Estatuto do Nascituro.
Mais links:
Sobre: Esta chave dicotômica foi
claramente produzida por alguém cuja opinião sobre o assunto se encontra no
passo (6). Esta pessoa decidiu permanecer no
anonimato porque está familiarizada com os expedientes adotados por parte dos
que estufam o peito para se auto-intitular pró-vida, que contraditoriamente às
vezes incluem atentar CONTRA a vida
de quem ousa discordar de suas opiniões intocáveis (fora as difamações e
ameaças de todos os tipos). Se o seu caso não é tão extremo e você está só
espumando de raiva, que tal uma vez na vida contra-argumentar, de preferência
com argumentos? E de preferência honestos? Se você gostou, ótimo. Se quiser
contribuir de alguma forma, entre em contato!

Femen: Revelando o Sextremismo Ucraniano

Ativista do Femen protesta pela “Topless Jihad”

(Texto gentilmente cedido por Letícia Oliveira do FEMENPUTECIDXS)


Por
Letícia Oliveira

Em meados de março de 2013, a
ativista tunisiana do Femen Amina Tyler (nome fictício) ficou conhecida
mundialmente por escrever em seu peito nu as frases “Foda-se sua moral” e “Meu
corpo me pertence e não é motivo de honra para ninguém” e ter sido publicamente
sancionada por um religioso salafista que disse que ela merecia ser apedrejada
até a morte segundo as leis islâmicas. Após o ocorrido, sua família a
enclausurou em um lugar desconhecido pelas outras ativistas do grupo, o que as
fez chamar por uma campanha de libertação da tunisiana, que segundo o Femen,
corria risco de morte. Uma das ações pela libertação de Amina foi chamada de
“Dia do Topless Jihad”, onde as ativistas de várias partes do mundo foram a
embaixadas e mesquitas protestar contra a “islamização” e conclamar as mulheres
muçulmanas a se libertarem do véu.
O grupo sextremista ucraniano
foi muito criticado por sua postura neocolonialista e acusado de suprimir as
vozes nativas de mulheres não ocidentais. Ocorreu uma reação imediata de
mulheres muçulmanas dizendo que não precisavam ser salvas, o “Muslim Women Against Femen”, ao que
uma das líderes do Femen, Inna Shevchenko prontamente respondeu, dizendo “preferir falar com
mulheres, mesmo que atrás delas tivesse um homem com uma faca”.
A agressão e opressão
perpetradas a Amina Tyler por sua família dentro de sua casa são, infelizmente,
uma história comum dentre os relatos de violência contra mulheres no mundo
todo. Drogar, bater e manter mulheres em cárcere privado – homossexuais e
transexuais também costumam sofrer esse tipo de ataques – é uma das estratégias
mais violentas contra a liberdade das mulheres, e mesmo as pessoas que não
sofreram esse tipo de abuso tem alguma história parecida para relatar,
inclusive envolvendo intolerância religiosa. Mas o que o Femen fez foi usar o
caso Amina para justificar sua agenda islamofóbica e de viés colonialista e
imperialista.
O discurso de “libertar”
mulheres da opressão do véu é antigo e ainda é muito usado para justificar
guerras e invasões de cunho neocolonialistas. Livrar as mulheres da opressão do
Taliban foi uma das muitas justificativas dadas por George W. Bush para a
invasão do Afeganistão, uma guerra que vem sistematicamente matando mulheres e
crianças em nome de uma suposta liberdade.

Mulheres nigerianas protestam
contra ataque de gangues em suas comunidades

Segundo
Zeinab Khalil no artigo “Ponto de vista: a crítica ao Femen”,
durante o período em que a Argelia foi colônia da França, era muito comum que
mulheres francesas fizessem “cerimônias de desvelo” para as mulheres argelinas
sob gritos de “viva a Argelia francesa”. Na visão dos colonizadores, tirar o
véu era uma forma de “civilizar” e libertar os nativos do país.
Apesar de
o Femen acreditar ter patenteado o topless como forma de protesto, ele é
recorrente na história da luta pelos direitos das mulheres. Há relatos de protestos com uso de nudez em
vários países do continente africano durante todo o sec XX, por exemplo.
Femen e
Feminismo na Ucrânia
O Femen
surgiu na esteira da Revolução Laranja ucraniana. A princípio, era um grupo de
universitárias voltado especificamente para denunciar o impacto negativo que o
turismo sexual e a prostituição tem na Ucrânia e seus protestos eram
provocativos e teatrais, e a decisão de usar o topless foi bem posterior à
criação do grupo. Segundo a ativista Inna Shevchenko, o grupo
foi criado a partir do momento em que ela e algumas amigas viram que a
revolução havia falhado:

Nosso primeiro protesto em topless foi uma manifestação política. Nós
não imaginamos que continuaríamos fazendo topless após isso. Eu fui contra
fazer topless por muito tempo, não podia aceitar. Mas nós não aguentávamos mais
a situação. Então decidimos fazer algo realmente radical. Como não estávamos
preparadas para pegar em armas, dissemos a nós mesmas: Ok, nossas armas são
estas. Elas estão sempre conosco. Nós transformaremos isto (seios) em armas e
os assustaremos. No dia seguinte nos demos conta de que pela primeira vez na
história da Ucrânia independente feministas haviam protestado! Nós conseguimos
a atenção das pessoas ao redor do globo. Nós percebemos que sim, poderia
funcionar.

De acordo
com a Wikipedia, o primeiro protesto topless do Femen ocorreu em agosto de 2009.
Segundo o artigo “Feminismo na Ucrânia Contemporânea: da alergia à ultima
esperança
” da historiadora e especialista em estudos feministas, gênero, história
oral e antropologia feminina do Instituto de Etnologia de Lviv, Oksana Kis, no
8 de março do mesmo ano havia ocorrido o primeiro grande protesto organizado
por grupos de lutas pelos direitos das mulheres em comemoração ao dia
internacional das mulheres nas maiores cidades ucranianas.
O fato de o grupo atestar que
é pioneiro em feminismo e protestos é só uma das muitas declarações
problemáticas que o Femen deu em relação ao feminismo ucraniano. Para Kis, a
retomada tanto do feminismo acadêmico quanto do ativismo feminista ucraniano se
deu no começo dos anos 90, após a independência do país. Ela relata que à época
as organizações feministas ucranianas decidiram seguir o caminho da cooperação
situacional em lugar do confronto com as autoridades por se tratar de um
movimento relativamente novo e ainda enfraquecido.
Segundo
estatísticas publicadas em artigo do Le Monde, as ucranianas recebem um
salário até 70% menor que os homens do país, e cerca de 73% da população
acredita que o homem deve ser o mantenedor do lar. Para a socióloga
especialista em estudos de gênero da Universidade Nacional de Kiev-Mohyla,
Tamara Martesnyuk, o maior êxito do Femen é a visibilidade. Para ela, os
métodos do grupo são inéditos em um país onde a imobilidade é histórica. Mas
ela vê problemas na falta de foco do grupo: “Ao se manifestarem contra tudo e
sem se importar contra o quê, as ativistas do Femen se apoderam de discursos
que não estão diretamente relacionados aos direitos das mulheres. Suas
denuncias a respeito da prostituição e da discriminação de gênero acabam se
perdendo dentro desta agitação desordenada. Fica difícil, neste caso,
distinguir a mensagem e o propósito real”.

A professora do departamento
de historia e teoria da sociologia da Universidad Nacional de Lviv, Tetyana
Bureychak, chama a atenção para o fato de que, apesar do choque inicial com o
topless, as pessoas não se atêm à mensagem do grupo, que não logrou nenhuma
mudança de fato no país. e assim a sociedade ucraniana permanece não se
importando com questões de gênero
Faz se
notar também o fato de que muitos grupos e feministas ucranianas alegam afalta de abertura do Femen ao diálogo com outros coletivos
e ONGs de luta pelos direitos das mulheres
, apesar de várias tentativas.
Uma alegação também feita por grupos e feministas brasileiras desde a chegada
do movimento por aqui. Além disso, as declarações do Femen a respeito da
ideologia do grupo são bastante confusas. Muitas vezes a organização tentou se
distanciar do feminismo, como atestou Anna Hutsol quando perguntada em 2011 se
Femen era um grupo feminista:

Não. Nós usamos o erotismo em nossas abordagens e na forma como nos
vestimos. Isso não é permitido pelo feminismo.

O novo
feminismo (traduzido equivocadamente como neofeminismo pela representante
brasileira da organização) seria uma “nova onda do feminismo” criada pelo
grupo, que seria nada mais que “juntar o movimento pelos direitos das
mulheres à uma visão pós moderna da mídia, política e a manipulação do público
masculino
”.
São
também conhecidas as declarações que o grupo dá sobre o feminismo “clássico”. Segundo Inna Shevchenko, “O
feminismo clássico já morreu, não funciona mais. Ele só existe nos velhos
livros e as vezes nas salas de conferências”.
Racismo e xenophobia

“Hitler is alive”, protesto
contra a indústria do sexo em Hamburgo, Alemanha jun/2012

A
xenofobia da europa ocidental contra o leste europeu não se justifica em “graus
de brancura” como disse Agata Pyzik no artigo “Branco nem sempre significa
privilégio
“, mas sim por uma crise econômica que
elevou o grau de xenofobia em toda a europa, especialmente contra ciganos e
muçulmanos de qualquer etnia. Sabe-se que este preconceito em relação aos
países do leste sempre existiu na europa e foi inclusive trazido para o Brasil
com os movimentos migratórios europeus – “polaca”, por exemplo, foi sinônimo de
prostituta por muito tempo no Brasil, e o tanto “polaco” quanto “polaca” ainda
são considerados termos pejorativos para poloneses e descendentes aqui no país.
Reconhecer que há privilégios em ser branco não quer dizer que não haja
preconceito xenófobo e étnico contra as populações brancas do leste europeu,
mas dizer que isso se deve a um certo grau de diferenciação na “brancura” é uma
falsa simetria.
Também não é o caso de
minimizar a opressão sofrida pelas mulheres no contexto pós soviético, mas
relatando uma crítica feita ao movimento assim que ele chegou ao Brasil, se é
verdade que mulheres sofrem opressão diariamente no mundo todo, a realidade
brasileira é diferente da realidade ucraniana, e não existe uma preocupação do
movimento em adaptar seu discurso às realidades locais, deixando de apoiar
lutas históricas dos movimentos feministas locais para se focar somente na
agenda do grupo.
Não podemos fechar os olhos
para a xenofobia e o racismo que tem se mostrado frequente nos países do antigo
bloco soviético, em especial Rússia e Ucrânia. E é neste contexto que o Femen
usa de sua suposta luta pelos direitos das mulheres como desculpa para
manifestações de ódio. Os exemplos variam desde citações como a dada pela líder e fundadora Anna Hutsol “Como
sociedade, não fomos capazes de mudar nossa mentalidade árabe em relação às
mulheres”, quanto manifestações abertas de antisemitismo, xenofobia, racismo e
até flertes com o neonazismo – além da islamofobia tão propagada pelo movimento
nos últimos tempos.
O
movimento sempre teve uma conotação claramente nacionalista. O primeiro manifesto do Femen dizia,
entre outras coisas, que o objetivo do grupo era “construir uma imagem nacional
de feminilidade, maternidade e beleza baseadas na experiência dos movimentos
das mulheres euro atlânticas”. Ela está aparente na escolha da coroa de flores,
ou vinok, símbolo da pureza das virgens, e no uso das cores da bandeira
Ucraniana, além do discurso de “desenvolver as qualidades morais, intelectuais
e lideranças das mulheres ucranianas”, e do claro conteúdo xenófobo de algumas
de suas manifestações.
Se na
França o Femen atraiu prioritariamente uma parte da esquerda que é
declaradamente islamofóbica, na Alemanha o influxo de mulheres conservadoras ao
movimento se traduz na adesão de membros do partido CDU e da
União Jovem Conservadora do país
, que reúne os partidos
conservadores católicos da Alemanha e tem uma agenda que advoga contra os
direitos reprodutivos das mulheres.
Em uma de
suas primeiras grandes manifestações na Alemanha, ocorrida no dia 25 de janeiro
de 2013 na Rua Herbert, conhecido ponto de prostituição de Hamburgo, o grupo
fez uso de simbolismo nazista para protestar contra a indústria pornográfica
dizendo serem a prostituição e a indústria do sexo análogas.Para isso, usaram
como mote o conhecido slogan “Arbeit macht frei” (o
trabalho liberta), muito usado nas entradas dos campos de concentração na
Alemanha nazista, e trocaram a letra “x” na palavra “sex” (em sex industry is fascism) por uma
suástica.
Em carta aberta ao Femen Germany, o grupo
libertário feminista alemão e*vibes lembrou  que não só o protesto teve
lugar em uma data muito próxima ao dia internacional de lembrança do
holocausto, além de lembrar-lhes que o uso de símbolos e slogans nazistas fora
de um contexto histórico são considerados como discurso de ódio na Alemanha, e
portanto ilegais. Também em uma carta de resignação, a ex ativista do Femen
Germany, Freya Victoria, lembrou que as prostitutas foram perseguidas pelo
governo nazista por serem consideradas indivíduos “anti sociais” assim como
judeus, homossexuais, ciganos e todos os que foram perseguidos pelo nacional
socialismo.
Outras
ligações conhecidas do Femen com pessoas e movimentos de cunho nacionalista e de
extrema direita já foram relatadas. No Brasil, a líder Sara Winter foi
e ainda é denunciada por manter ligações com a extrema direita nacionalista, e
na Inglaterra, descobriu-se recentemente que o responsável pela manutenção da
página do Facebook do Femen UK seria um homem que se apresenta como David Jones
e é membro da English Defence League, uma
associação de extrema direita que usa de violência contra
imigrantes,especialmente contra muçulmanos, na Inglaterra.
Mas as
manifestações de ódio mais contundentes foram produzidas pelo próprio Femen UA
(ou International). Segundo o site indymedia.de, em
setembro de 2009 o Femen mandou uma carta ao Serviço de Inteligência da Ucrânia
(SUB) pedindo para que medidas fossem tomadas contra a peregrinação anual dos
judeus hassídicos albaneses à cidade ucraniana de Uman durante a páscoa
judaica. A carta dizia que “a afluência de representantes do judaísmo ortodoxo
que possuem padrões culturais e comportamentais específicos trazem alguns
perigos…” “os peregrinos demonstram total desrespeito às tradições locais”,
“qualquer tentativa de ataque à nossa cultura deve ser suprimida” e o que seria
a verdadeira razão do pedido “as evidências frequentes de assédio, coerção e
até mesmo estupro de ucranianas pelos judeus hassídicos não são levadas a
público e esmiuçadas em prol de uma pseudo tolerância religiosa”.
Ainda
segundo o mesmo artigo, em 25 de agosto de 2010 o Femen mandou uma carta para a
prefeitura da cidade ucraniana de Lviv
, às vésperas da partida pela
Europa League onde o time local Karpaty-Lviv enfrentaria o time turco
Galatasaray. A carta conclamava a prefeitura a banir os fãs do time turco da
cidade e incentivando os torcedores do Karpaty “a apoiar nosa iniciativa e não
deixar os ‘machos turcos’ bancarem os chefes pela capital cultural da Ucrânia.”
A torcida do Karpaty-Lviv é conhecida por suas expressões de racismo e fascismo
dentro e fora de campo, e o time foi condenado pela UEFA a pagar uma multa de
25 mil euros por manifestações de cunho nazista durante esta mesma partida contra
o Galatasaray.
De onde
vem o dinheiro do Femen?

O
financiamento do Femen é algo que levanta muitas questões desde sempre, como
pode ser visto inclusive no antigo site do grupo. O que
se sabe ao certo é que no ano de 2010 as ativistas declararam em entrevista ter
um aporte mensal entre 600 e 700 euros, todos provindos de doação. O milionário
estadunidense Jed Sunden, que à época era dono do conglomerado KP Media, editor
do Kyiv Post, maior jornal de língua inglesa da Ucrânia (no qual Anna Hutsol
era colaboradora) contribuía com 200 euros, e o milionário alemão Helmut Geier,
mais conhecido como DJ Hell, contribuía com 400 euros. O resto do montante
provinha das doações feitas ao grupo por apoiadores anônimos.

Não é segredo para ninguém que
Jed Sunden realmente financiou o Femen por muitos anos. Ele próprio admitiu
algumas vezes apesar de não dizer o valor de tal contribuição.
Mas em recente comunicado ao site de centro
direita italiano Il Foglio
, assinado por sua assistente Valeriya
Kirchanova, Jed Sunden disse que não financia mais o Femen desde 2011. Disse
ainda que as financiou desde o começo por acreditar na luta contra o turismo sexual,
mas que a partir do momento que elas estenderam seu campo de ação e passaram a
criticar religiões, política e a Eurocopa de 2012 elas perderam o foco. O
comunicado foi enviado em resposta a uma matéria do diário, que reproduziu uma
notícia de 2012 que diz que uma jornalista do canal ucraniano 1 + 1 se
infiltrou no Femen e denunciou que o grupo tinha um orçamento mensal de 2500
euros, sendo Jed Sunden um de seus maiores financiadores, de acordo com a
matéria original do canal ucraniano.
Segundo
as ativistas, suas únicas fontes de renda são os produtos vendidos em sua loja
virtual e as doações feitas às suas contas. Os produtos são caros: para ter uma
impressão dos seios de uma ativista (boobprint) o incauto apoiador terá que
desembolsar 70 euros. Também é comum venderem camisetas feitas à mão por
ativistas, ou previamente usadas por alguma delas, por 100 euros.
No
Brasil, a representante do grupo, Sara Winter, receberia um salário de 400 dólares da matriz, segundo
matéria da ESPN Brasil. Apesar de ter negado primeiro, Sara confirmou ter
recebido o tal salário, mas “apenas algumas vezes” e de acordo com a própria, o
Femen internacional não manda mais dinheiro para a
franquia brasileira
.
Além
disso, há as acusações de venda de protestos. Uma
delas foi provada real e aconteceu no dia 8 de março de 2012 na Turquia, quando
o grupo viajou ao país patrocinado pela marca de lingerie Suwen International.
De acordo com a mídia local turca, o Femen assinou um contrato com a
empresa para divulgar a companhia
. Para a fundadora do
coletivo, Anna Hutsol, “a marca procura oferecer lingerie saudável para as
mulheres, e é por isso que o Femen visitará a loja da Suwen Internacional, já
que considera a marca uma aliada.” Além disso, a Suwen também desenvolveu umalinha de lingeries com o nome “Femen”. O
protesto, que se deu em frente à catedral Hagia Sophia, onde as participantes
usaram produtos da marca e fizeram uma sessão de fotos prévia divulgando o nome
da Suwen, resultou na deportação das ucranianas.
Dadas as declarações prévias
de algumas integrantes do grupo, o que se vê é que o Femen não tem medo de usar
a exposição de suas ativistas em meios de comunicação como forma de angariar
fundos. No artigo “Two Bad Words: Femen & Feminism in Ukraine” da Jessica
Zychowicz, vemos a seguinte citação atribuida à Anna Hutsol [1]:

Eu acho que se você pode vender biscoitos desta forma (através do apelo
às massas) por que não usar dos mesmos métodos para chamar a atenção para
problemas sociais?

Em entrevista à revista
austríaca Falter, Inna e Sasha Shevchenko responderam que não viam nenhum
problema em posar nuas para a Playboy. Nas palavras de Inna: “Mulheres nuas já
estampam a capa da Playboy. Se nossos protestos chegassem às capas seria um
grande sucesso, pois significaria que os homens aceitam a luta feminina”.

A
exposição do corpo como “arma de guerra”
Uma das várias críticas feitas
ao Femen é que todas as suas ativistas de topless não fogem de um padrão de
beleza eurocêntrica. São todas mulheres jovens, magras, brancas e loiras, de
preferência. Quando questionadas a respeito do porque seguir esse padrão
excludente, as líderes do movimento dão respostas no mínimo curiosas.
Na página
do facebook do Femen France, vemos uma foto de duas ativistas que,
segundo o Femen, estariam fora do padrão e seriam uma resposta às cobranças.
Segundo a página, as garotas que mais aparecem nas fotos são aquelas que estão
mais envolvidas com o movimento. E se as ativistas são geralmente magras é
“porque em uma sociedade tão hostil aos corpos femininos, garotas devem estar
preparadas para enfrentar comentários, insultos e violências física e moral”.

Em entrevista a Jessica
Zychowitz, Anna Hutsol disse em relação ao fato de não haver mulheres mais
velhas no Femen [2]:

Mulheres fortes não podem ser tímidas na Ucrânia. Considere o fato de
que um corpo velho não é tão bonito quanto era aos 16; bem, também há os
vizinhos, parentes, etc que acham que mulheres mais velhas não podem sair
gritando em protestos ou envolver seus netos. E é mais difícil enfrentar o
preconceito quando se é mais velha do que quando você tem 20, 22, 25 ou 26,
porque quando se é mais nova você não tem nada a perder.


A ativista bielorrusa
Alexandra Nemchilova: piada
Usada
como exemplo de ativista gorda quando indagadas sobre o porque de não aceitarem
mulheres fora do peso considerado padrão, a bielorussa Alexandra Nemchilova
servia de escada cômica nos protestos do Femen internacional. Vestida de “sex
bomb”, com a cabeça raspada e de bigodes falsos para
personificar ditadores ou até mesmo colocada em um chiqueiro para
protestar contra a Eurocopa em 2012, a falta de respeito e a chacota eram
latentes.
Também se
nota a falta de ativistas negras e orientais no grupo, e mesmo no Brasil a
tendência a buscar ativistas que se enquadrem ao padrão eurocêntrico de beleza
foi notada e bastante discutida. E apesar de o grupo hoje negar, existe sim um processo seletivo para
entrar no Femen. Usar somente corpos jovens e que seguem os padrões impostos de
beleza é uma forma de ter a atenção irrestrita da mídia, que o Femen vê como
aliada. Mas ao atender as demandas daqueles que elas consideram como aliados,
acabam excluindo aquelas que realmente seriam as verdadeiras beneficiárias de
seu suposto ativismo: as mulheres.
1 Zychowicz, Jessica. 2011. Two Bad Words: Femen & Feminism
in Ukraine, pag 221
2 Zychowicz, Jessica. 2011. Two Bad Words: Femen &
Feminism in Ukraine, pag 219
Agradeço
a Anna Rocha pela ajuda nas pesquisas e na revisão e Jose Antonio Pano pela
ajuda nas traduções