Conservadores Avestruzes

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É engraçado ver como a sociedade se coloca diante das grandes questões polêmicas e dos problemas por ela enfrentados. Mais engraçado ainda é ver como setores da sociedade acreditam que tudo possa se resolver com um simples passe de mágica legislativa, proibindo tudo o que puderem, sem maiores discussões. Claramente, refiro-me às pessoas conservadoras.

Para uma pessoa progressista, é difícil entender como a cabeça de um conservador funciona. A melhor explicação que eu tenho é que pessoas conservadoras agem como avestruzes, já que, quando se deparam com problemas ou questões polêmicas, em vez de debatê-los para depois tentar resolvê-los, eles decidem enfiar as suas cabeças confusas no cômodo e protegido solo da proibição, do egoísmo e da indiferença.

Pessoas conservadoras, na verdade, nunca estiveram preocupadas em resolver problemas, elas apenas querem ficar longe desses problemas, afinal, o que os olhos não veem, o coração não sente.

Imagino que se você chegou a ler este parágrafo, ou você é um progressista, ou você é um conservador cuja curiosidade é maior do que o ódio ou pena que você deve estar sentindo de mim neste momento. Aliás, obrigado por ler esse texto! Agora, vamos à demonstração dos fatos.

Nada como comprovar a minha tese de que conservadores agem como avestruzes entrando no polêmico tema do aborto. Ah, o aborto! Vejam, eu não quero entrar no aspecto religioso da questão, pois reconheço que, se o aborto for tomado apenas em seu conceito teórico, realmente é algo discutível. Eu quero falar da eficácia e utilidade da proibição do aborto no Brasil.

Recente pesquisa divulgada na revista The Lancet http://migre.me/7FiUz) demonstra que a incidência de abortos é maior nos países que os proibiram, e não, por incrível que possa parecer, naqueles que os legalizaram.

Além do número maior de abortos, as mães que os praticam estão mais vulneráveis a complicações decorrentes desses procedimentos, já que feitos sob o manto da clandestinidade. Ou seja, proibir o aborto não garante um menor número dessas ocorrências, além de pôr em risco as vidas das mulheres que o fazem de forma clandestina.

Como isso pode ser possível?! O x da questão está na clandestinidade! Os países que legalizaram o aborto puderam enfrentar esse problema como um caso de saúde pública, dando assistência às mulheres, orientando-as e, enfim, efetuando o procedimento num hospital, e não nas tão famosas “bocas-de-porco”, encontradas aqui no Brasil, por exemplo.

É algo muito raso também afirmar que haveria um boom de abortos, caso fossem legalizados, afinal, uma mulher grávida não acorda um belo dia e diz: “Acho que hoje tô a fim de um aborto”. É a mesma coisa de pensar que haveria mais gays no mundo se eles pudessem contrair matrimônio civil. Imaginem: “Ah, agora que eu posso casar, vou virar gay”. Não faz sentido, né?!

Enfim, voltando ao aborto. Pesquisas mostram que a proibição do aborto não implica na redução de sua ocorrência, além de todos os perigos decorrentes às mães por conta da clandestinidade das cirurgias.

Sendo assim, você continuaria contrário ao aborto, mesmo que a sua legalização implicasse na sua redução, como demonstram as pesquisas?! Essa proibição faz algum sentido?! Nesse caso, a proibição não resolve nem diminui o problema. Contudo, uma pessoa conservadora, agindo como um avestruz, prefere enterrar a sua cabeça no cômodo e protegido solo da proibição a enxergar os fatos.

Esse foi o primeiro exemplo para demonstrar a minha teoria de que conservadores agem como avestruzes. Vamos à outra grande polêmica: os casamentos homossexuais.

A proibição de contrair casamento, por parte de pessoas do mesmo sexo, talvez seja a maior prova de que o princípio da igualdade de todos perante a lei é uma piada, e que o Brasil não é uma democracia, mas uma ditadura de uma maioria branca, religiosa e heterossexual.

Os conservadores temem um boom de gays, caso tais casamentos fossem regulamentados, como se a definição da orientação sexual de uma pessoa dependesse de um artigo de lei que proíba ou não as tais uniões civis. Engraçado, não é?!

Enfim, proibir as pessoas do mesmo sexo de contrair matrimônio não implicará em redução ou aumento do número de homossexuais, como se esse fosse um problema. Se o tal livro sagrado estiver certo, eles certamente queimarão no inferno, assim como os ateus, mas até esse dia não chegar, eles deveriam ter os mesmos direitos da maioria.

Contudo, os conservadores, mais uma vez, preferem enterrar as suas cabeças no cômodo e, neste caso, sagrado solo da proibição divina, ao invés de pensar que casais homossexuais também enfrentam problemas relacionados à guarda de filhos, divisão do patrimônio conjunto, imposto de renda, direito à pensão por morte e herança, assim como os heterossexuais, e, portanto, tal negação de direitos os prejudica muito.

Este outro caso talvez seja o pior de todos, contudo um pouco diferente dos anteriores. Muitos conservadores pertencentes às classes A e B não suportam a pobreza e todos os problemas dela decorrentes. Quando associações de moradores de bairros da elite se dizem preocupadas com o problema da violência, elas não estão preocupadas com as causas desse fenômeno, mas apenas com o seu próprio umbigo. Enfim, contanto que eles estejam a salvo, o problema da violência não lhes diz respeito.

Neste caso, não se trata de uma proibição propriamente dita. Trata-se da mais nojenta indiferença em relação ao maior problema brasileiro e grande causa da violência: a desigualdade social.

Os ricos e a classe política por eles sustentada, na verdade, não estão preocupados em acabar com a desigualdade social ou com a violência; eles apenas a querem bem longe dos seus lindos bairros que lembram a Europa ou Beverly Hills. Eles não querem tentar resolver ou diminuir a miséria que muitas vezes os circunda, eles apenas querem um Chuck Norris que os defenda, para, dessa maneira, poderem enfiar a cabeça no cômodo e protegido solo do egoísmo e da indiferença com o próximo. Isso é muito cristão, aliás!

Há muitos outros exemplos, como na proibição do uso de entorpecentes etc., mas se continuar, o texto ficaria muito mais longo do que já está. Antes que alguém se manifeste, devo frisar que nem toda a proibição é inútil ou ruim, afinal, isso seria de uma ingenuidade colossal.

O que se critica nesse texto é o pensamento recorrente das camadas conservadoras da sociedade, que creem piamente na proibição como a melhor maneira de resolver qualquer problema, como no caso do aborto ou das drogas, ou da simples imposição da vontade de uma maioria branca, religiosa e heterossexual, no caso dos casamentos entre pessoas do mesmo sexo, ou da indiferença criminosa à gritante desigualdade social por parte da elite e da classe política.

Enfim, os problemas continuam aí, sem muita solução, enquanto eles estão bem protegidos, com as suas cabeças enfiadas no cômodo e protegido solo da proibição, do egoísmo e da indiferença. Esses são os conservadores!

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