Dica de Livro

Tratado de Ateologia


Ola, me chamo Argeu e eu gosto bastante de ler, principalmente livros sobre ateismo e ciencia. Estarei semanalmente postando livros sobre os temas acima.
O livro dessa semana chama-se Tratado de Ateologia de Michel Onfray, critica principalmente o cristianismo e islamismo e fala tambem sobre a tortura que as pessoas se submetem pela recompensa de um paraiso, comenta tambem o fato dos religiosos subjulgarem livros por nao serem religiosos e pelo fato de existir somente um livro sagrado. E muito bom o livro e para quem nao leu ainda recomendo.

P.S. lamento a falta de acentos, postei pelo celular.

A parábola do Ogan da Rocinha

     Minha intenção aqui é a reflexão sobre a solidariedade como consciência, não como dever. Quem doa humanidade torna-se mais humano. Quem detrata a humanidade do outro, perde aos poucos a sua, mata-se a cada instante:
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                                               Blog Preso por Fora
 
     Aconteceu de, num certo dia, no Largo da Carioca (Rio de Janeiro), aparecer um PHD em Teologia questionando, com fim de pôr a prova o Homem da Roça. Disse o Doutor em tom de deboche:
_ Mestre, o que precisamos fazer para que venhamos herdar a vida eterna?
O Homem da Roça sorriu já sabendo a intenção do Doutor, respondendo:
_ Amigo, o que está escrito na sua Bíblia? Como você interpreta?
Pôs-se a dizer, o Doutor, com a expressão de quem tem tudo decorado e enumerando com os dedos:
_ Ame ao Senhor, o seu Deus de todo o coração, de toda alma, de todas as suas forças e de todo seu entendimento e… ame o próximo como a si  mesmo.
Replicou o Homem da Roça:
_Você respondeu de forma sensata. Se fizer isso, ficará vivo! – disse colocando a mão nos ombros do Doutor.
     Todavia o Doutor, encabulado, querendo justificar-se, posando de improviso relativo a alguém que ainda tem a fazer mais uma pergunta e que era essa a pergunta principal e não a outra, disse:
_ Tudo bem, mas antes de ir diga-me algo: quem é o meu próximo?
O homem da Roça virou-se aos que o ouvia e em tom de voz mais alto começou, com delicadeza, a contar uma história:
_ Um homem vinha de moto, à noite, do Centro da Cidade em direção a Madureira e, passando em frente à comunidade do Jacarezinho cercado e abordado por assaltantes. Estava com todo seu salário na carteira. Míseros R$ 545,00! Recusando-se a entregar o dinheiro que pagaria o aluguel de R$ 250,00, as compras do mês e o remédio da filha de 4 anos, os assaltantes espancaram-no, despiram-no deixando apenas com a roupa íntima. A impressão é de que estava morto, principalmente após o tiro que o alvejou.
O Homem da Roça percebeu que os que ali estavam ficaram espantados. Continuou a contar:
_ Eram 22:40 hs da noite. Por ser um local violento não passava mais ninguém passeando pelos comércios da região. Apenas trabalhadores voltando de seus trabalhos. Aconteceu de estar passando no mesmo beco que o rapaz estava jogado um Pastor, um Ministro de Louvor e um Diácono. Vinham os três de terno e engravatados, após terem contado o dinheiro que arrecadaram naquele dia para a “obra de Deus”. O Pastor pregara naquele dia sobre Amor. Ao chegarem perto do rapaz, viram-no apenas de roupas íntimas, deram a volta em torno do corpo, pensando mecanicamente “está vendo, o que não faltou foi oportunidade aceitar a Cristo” e prosseguiram seus caminhos.

De igual modo passou um Padre, quando passou pelo beco e o viu, contornou seu corpo, seguindo seu caminho, após ter feito sinal da cruz. Pensou ser um usuário de Crak que estava devendo. O rapaz agonizava bem baixinho, o rosto estava desfigurado.

       Entretanto, passava pelo beco um Ogan¹, morador da Rocinha que era dono de um comércio dentro da favela do Jacarezinho. Ao ver o rapaz, jogado, visivelmente com a perna quebrada, pois uma das pernas estava dobrada por cima das costas, o Ogan olhou-o e desesperou-se. Compadeceu-se tremendamente. Agachou-se evitando move-lo para que não prejudicasse o rapaz fisicamente. Olhando para o rapaz, pôs uma mão na cabeça da vítima, com carinho e disse:
_ Rapaz, vai ficar tudo bem, você vai ficar vivo.
      Em resposta o rapaz agonizou mais uma vez. Com a outra mão pegou o celular e ligou para um Hospital particular famoso localizado no bairro Méier. Mesmo hospital onde fora operado um jogador de futebol reconhecido mundialmente. Após ter ligado e comunicado escorreram as lágrimas. Pôs-se a pensar o porquê dessas coisas acontecerem, qual o motivo das pessoas não conseguirem viver como irmãos.
Lembrou-se da frase de Martin Luther King, negro americano e ativista pacifista, que dizia:
“Aprendemos a voar como os pássaros, a nadar como os peixes; mas não aprendemos a simples arte de vivermos juntos como irmãos.”
O Homem da Roça contando percebeu que agora, os o que o ouvia não apenas estavam estupefatos, porém também com raiva. Continuou contando:
_ O Ogan no outro dia, pela manhã, no Hospital, pediu a um de seus funcionários que chegasse mais cedo e abri-se a Padaria. Como não sabia o nome do rapaz, que permaneceu por três dias em um estado horrível, sem poder falar, ficou uma semana inteira até que o rapaz se recuperasse. Não sabia sobre a família. Pagou todas caras despesas do Hospital e, depois do rapaz, quando recuperado razoavelmente, lhe falou o que havia acontecido, enquanto o rapaz dormia, deixou R$ 1000.00 em na mão dele. Foi embora nunca mais tendo visto o rapaz e agradecendo a Deus por aquela vida ter sido salva.
Terminando a história o Homem da Roça perguntou:
_ Então Doutor, diga-me segundo o que pensa: Qual desses você acha que foi o próximo do homem que caiu foi espancado por bandidos?
Ao que lhe respondeu o Teólogo:
_ Ora, aquele que teve misericórdia do Rapaz!
O homem da Roça aproximando-se, pondo a mão sobre a nuca do Doutor e olhando nos olhos disse-lhe:

 

_ Vá e faça o mesmo! Siga o exemplo do Ogan da Rocinha!

Lucas Gonzaga

1- Ogan (Click para saber)

Religião e estupidez no Brasil – Paulo Ghiraldelli

Um excelente texto de Paulo Ghiraldelli, vale a pena a leitura.

Homero

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Religião e estupidez no Brasil

09/08/2011

Sílvio Santos perguntou para uma garota o signo dela. Prontamente, ela respondeu “sou evangélica”. Sílvio riu gostoso! Eu não ri! Eu senti ali que o Brasil vai por um caminho perigoso.

Sim, acreditar em horóscopo é “paganismo” para os evangélicos. Eles não podem fazer como todos os outros brasileiros que, enfim, lêem horóscopo, sabem seus signos e se divertem com a crença em algo que é como acreditar em premonição de uma avó ou tia. Acredita-se sem levar a sério, ou leva-se a sério sem acreditar.

Ter crenças mágicas é algo de quase todos nós, por mais escolarizados que possamos ser. Faz parte de nossa cultura. É mais ou menos como acreditar em Papai Noel quando se está saindo da fase propriamente infantil: acredita-se e desacredita-se ao mesmo tempo. Acreditar em alguma coisa que, conforme ficamos mais velhos e mais escolarizados, foge do bom senso, se traz algum conforto psicológico, não é difícil de ocorrer. É como acreditar em “trabalho” para “trazer o amor de volta”. No desespero de causa, é um alívio psicológico imenso poder lançar mão de um conforto psicológico não racional. Há dezenas de confortos psicológicos desse tipo. Mas o  horóscopo nem é mais isso, é uma brincadeira mesmo.

Uns tem conforto psicológico com magias e outros com religiões. Há os totalmente laicos, que podem conseguir isso com a poesia. Cada um tem seu bálsamo para a alma, pois sem isso acabamos tendo de encontrar paliativos em drogas injetáveis ou tomadas por via oral. Nós humanos nos tornamos mais sensíveis que nossos parentes ditos brutos, e criamos uma vida chamada de civilizada que, enfim, não suportamos. Temos que crer em mágicas ou alguma coisa que se aproxime delas, em diversos graus, para enfrentarmos uma sociedade que, na verdade, como disse Weber, é “desencantada” e não permite no seu funcionamento  estrutural nenhuma mágica.

Eu posso entender as pessoas que levam a vida fazendo simpatias contra verrugas, vendo Saci Pererê no quintal ou rezando para Santo Antonio lhes conseguir um marido.  Entendo e respeito. Não tenho problemas em viver no meu país. Sou filósofo, mas tenho lá meus estudos de antropologia! Todavia …

A menina evangélica, ao responder para o Sílvio Santos, trouxe-me uma informação drástica. Ela mostrou que a sua religião não está em disputa com outros cristianismos e, sim, em disputa contra as religiões pagãs, as religiões mágicas.  Pois, ao tomar a Bíblia ao pé da letra, os evangélicos acabaram se colocando no âmbito daquilo que a religião cristã, já no seu nascedouro, quis evitar, a saber, sua classificação como religião que estaria no mesmo nível das religiões pagãs.

A religião cristã católica (e algumas igrejas protestantes a seguiram nisso) criou a teologia e, para ajudá-la, manteve viva a filosofia. A teologia tinha uma idéia básica: Deus está em um outro mundo, não nesse mundo. Ele não pode ser conhecido, mas podemos ter contato com ele pela fé. Mas Deus poderia ser admitido (que não é o que é conhecido e nem o que é dado pelo contato da fé), também, por mecanismos não empíricos. Por isso mesmo, todas as “provas” da existência de Deus, feita pelos santos católicos que foram grandes filósofos – Santo Anselmo, Santo Agostinho e Santo Tomás –, nunca foram provas como as da ciência moderna, é claro. Foram demonstrações lógico-linguísticas ou então raciocínios linguísticos. Isso garantiu à religião católica sua sobrevivência diante dos intelectuais. Assim agiram, também, os protestantes cultos. É claro que tanto entre os protestantes cultos quanto nos pontos mais altos da hierarquia católica a ordem sempre foi a de fazer uma certa vista grossa para com o modo da população não letrada entender a religião. Caso a população precisasse de mágica, não custava aqui e ali permitir algum milagre. Mas isso nunca se tranformou em ortodoxia.

Agora, as igrejas evangélicas, especialmente no Brasil, romperam com isso. Como elas fazem mágica, competem com as religiões que não estão mais em concorrência, o paganismo! Não se trata do paganismo afro, que disputa terreno com eles, mas valendo-se de outros mecanismos, mas o paganismo do passado, coisas que ninguém mais toma como religião. Daí a incapacidade da garota de entender a pergunta do Sílvio Santos. Ela foi ensinada a dizer que não acredita em horóscopo porque é evangélica. Uma pessoa não evangélica, desatenta, diria: “essa menina é boba?” Essa seria uma observação válida!

Bem, mas qual o resultado disso tudo, para nós, os que estamos de fora desse meio religioso? Devemos dar de ombros e ficarmos quietos, respeitando nossa postura liberal-democrática que afirma e defende a liberdade de religião no Brasil? Ou temos algo com que nos importar?

Não estou dizendo que temos de romper com nossa crença liberal e começar a criar dificuldades para os evangélicos, ainda que eles não se cansem de criar dificuldades para os brasileiros que não são evangélicos (os gays que o digam!). Longe de mim isso. Mas temos de pensar em algo que já passou da hora de pensarmos. A questão é a seguinte: uma das virtudes mais importantes de nosso aparato de cognição individual é a capacidade de interpretar. Ler e interpretar é algo ensinado na escola. É cobrado. É uma habilidade altamente valorizada em todos os exames internacionais pois, afinal, é algo extramemente útil na vida moderna. Mas, e se as pessoas são educadas a não mais interpretar? E se as pessoas, já em tenra idade, começam a ser incentivadas para eliminarem qualquer metáfora, qualquer figura de linguagem, como irão se portar no mundo? Poderão elas cantarem, escrever poesias, admirar um quadro, entender uma bula de remédio? É difícil. Pois é isso que a educação evangélica faz: ela desestimula a interpretação. Não é que ela diz que só a Bíblia deve ser lida literalmente. Ao ensinar a menina evangélica a não entender que pode acreditar no horóscopo em um nível que não é a da sua crença religiosa e que, portanto, não há problema em dizer seu signo e sua religião, as igrejas evangélicas estão indo longe demais. Estão simplesmente emburrecendo os jovens. Estão indo para além de afirmarem que há só uma leitura da Bíblia. Estão começando a sugerir que há só uma leitura correta a respeito de todo e qualquer texto, de todo e qualquer acontecimento. Isso é perigoso. Caso isso não seja revertido, podemos ter, dentro de poucos anos, uma geração inteira incapaz de executar tarefas simples, pois terão perdido a simples capacidade de entender o que se lê. Haverá uma quantidade de analfabetos funcionais maior do que o país pode suportar.

Assim, não à toa, já hoje, pegamos alunos que não conseguem mais ler textos, mesmo tendo sido alfabetizados. Pois ler é, sempre, uma interpretação. Isso não quer dizer que não exista a leitura errada e a leitura certa. É claro que há. Pois o certo e o errado dependem dos objetivos que colocamos aprioristicamente para podermos avaliar os alunos ou avaliar qualquer pessoa que conta uma história. Agora, quando não se está avaliando, quando se está incentivando o aluno no aprendizado, em que ele precisa necessariamente de interpretar, pois se ele tomar qualquer palavra no seu sentido literal não irá entender nada, então, nessa hora, as igrejas evangélicas atrapalham. O que elas fazem com os jovens é triturar seus neurônios. Nesse caso, a liberdade religiosa que permite às igrejas pregar o que querem, começa a dar frutos ruins. Pois a pregação não está mais no âmbito do conteúdo dos assuntos, e sim no campo do estrago às funções cognitivas da juventude.

Quando uma garota não consegue mais entender que ela pode ler o horóscopo e acreditar nas tendências que diz o seu signo, e que isso é uma informação em um nível do âmbito do folclórico ou do divertido,  que não se trata de algo que concorre contra o cristianismo (ou, ao menos, não deveria ser), essa garota já não é mais uma moça desinformada historicamente, ela é uma pessoa que emburreceu de vez. Ela perdeu a capacidade básica para a leitura, que é saber que a leitura possui níveis. Ou seja, um texto não tem várias interpretações porque podemos dizer “cada cabeça uma sentença”. Se fosse assim, teríamos apenas um relativismo banal. Um texto tem várias interpretações porque um mesmo leitor pode criar várias visões do que está dito, e hierarquizar os níveis dessas visões de modo a poder usá-las nos seus discursos cotidianos segundo ocasiões e contextos.

Um ateu inteligente pode dizer “Vá com Deus” para o filho que vai à escola. Um religioso inteligente pode dizer para um colega que o está perturbando “ah, o diabo que te carregue”. Do mesmo modo que um protestante fervoroso, não burro, pode dizer, junto de uma tia católica, até de modo sério: “que sejamos abençoados pela Virgem Maria”. Esse “jogo de cintura” ajuda as pessoas a lerem uma história do Chapeuzinho Vermelho como um conto infantil ou como um conto que poderia, ao mesmo tempo, nos brinda com uma versão “psicanalítica”, onde a história seria, na verdade, a história de um homem pedófilo ou tarado, um amante da velha, que na ausência dela gostaria de fazer sexo também com a neta. O caçador bem poderia ser o corno da história, marido da velha. Ler isso assim, até de forma jocosa, não impediria ler de outra maneira. São sofisticações que vamos acumulando nas nossas formas de colocar camadas e camadas de interpretação sobre as leituras de nossos textos preferidos. Mas o estudante evangélico vem castrado já de casa. Ele só pode ler uma vez, e de forma literal. Ora, como a forma literal é um exercício de descrição, mas a própria descrição já é feita com a interpretação do pastor desescolarizado (ou pessimamente escolarizado, ou cheio de preconceitos) na igreja, então, quando o jovem chega na escola e é exigido dele uma atitude mais inteligente, ele tropeça.

Ora, se o tropeço desse jovem é individual, tudo bem. Mas se o tropeço desse jovem é coletivo e, pior ainda, se vários deles começam a achar que o professor ou a sociedade culta estão contra eles, aí é hora do estado intervir. É hora do estado pensar em convocar a sociedade para discutir o que está havendo. Pois a nação começa a correr perigo. Em poucos anos, ninguém mais poderá ser cidadão. Pois para ser cidadão é necessário o entendimento das leis. Com esse tipo de jovem, atrofiado mentalmente por causa de uma estranha fórmula de leitura que não é leitura alguma, o país todo pode estar assinando um cheque em branco para um destino perigoso.

Se olharmos o quanto ninguém mais passa nos exames da OAB, isso que acabei de dizer é mais preocupante ainda. É hora dessas questões todas serem colocadas publicamente entre as elites. É hora de encontrarmos religiosos inteligentes (eles ainda existem?) que tenham possibilidade de ajudar-nos a senão reverter isso, ao menos estancar essa forma de deseducação das muitas das igrejas evangélicas.  A Bíblia é sagrada? Pode ser, mas ela não foi feita para ser sacralizada pela burrice. Ela deveria ser uma fonte de histórias morais capazes de fazer cada um promover interpretações e interpretações, sem o aval de pastores que se dizem iluminados. Os pastores e as igrejas não podem ficar com o monopólio dos cérebros dos jovens. Isso pode tornar o Brasil um país inviável.  Um povo que não interpreta é um povo imbecilizado. A cidadania depende de gente que interpreta e reinterpreta. Só é cidadão aquele que lê a lei e pode dizer o quanto ela é precisa e o quanto ela é vaga. Estão tirando dos nossos jovens essa capacidade. Estão lhes roubando a cidadania. Isso é bem pior que o Golpe de 64.

© 2011 Paulo Ghiraldelli Jr., filósofo, escritor e professor da UFRRJ

 

http://ghiraldelli.pro.br/2011/08/09/religiao-e-estupidez-no-brasil/

Chris Enio em: Como dizer o que se passa comigo, sem dizer? Parte IV

  Blog Preso Por Fora

Parte I  AQUI

Parte II AQUI

Parte III AQUI

Ano: 2010
Mês: Julho
Dia: 2, quarta-feira, 14:34 hs
Obs.: Dia ensolarado, 35°, Jogo do Brasil em uma copa do Mundo.
         Gisele, a inspetora, com seu andar bem devagar, respiração ofegante, como quem está cansada, cuidando-se para evitar o roçar das coxas, caminhava com dificuldade em direção a uma sala de aula para dar um aviso. Gisele, a inspetora, era respeitada no colégio, tanto por seus colegas de trabalho, quanto por alunos. Porém, Gisele, mesmo tendo conhecido o valor do respeito, não aprenderá a respeitar seu corpo, era obesa, tinha diabetes. Não resistia a um bom prato de comida. Seus desmaios eram cada vez mais frequentes, entretanto seus amigos, apesar de muito preocupados com a saúde de Gisele, já haviam se cansado de com muito carinho, inúmeras vezes aconselhá-la sobre a doença, como se procede, o que fazer… Não obstante já soubesse, Gisele, pormenorizadamente todas as dicas e cuidados pertinente a Diabetes.
        Tinha as instruções e dietas do médico de cor.
Os barulhos de um colégio, evidentemente, são de vozes para todos os lados, vozes de adolescentes, crianças, repreensões de Professores, inspetores, vozes de longe, de perto, embora também houvesse os sons urbanos da Rua Dias da Cruz, rua movimentada em que se localizava o colégio, com seu trânsito infernal. Gisele chega a última sala de aula em que haveria de dar o recado:
_ Com licença Professora. – disse Gisele em voz baixa após abrir a porta. A professora consentiu.
Agora com a voz mais alta, pôs-se a dar seu aviso:
_ Boa tarde, gente! – Esperou, sabendo que todos iriam responder. Os alunos responderam-lhe o comprimento pronunciando pausadamente, em coro.
Continuou Gisele:
_ Olha só, hoje é dia de jogo e o colégio armou um telão na quadra coberta. Quem quiser, pode ir embora, mas não sabem o que estão perdendo!
Todos gritaram em júbilos, de alegria, sorriam, gargalhavam. Gisele voltou:
_ Ah, aliás, a cantina continuará aberta. Não será preciso comprar nada na rua.
          O sinal bate e entusiasmadamente todos começam a sair. Num alvoroço, conversando sobre o jogo, sobre os astros do futebol brasileiro, entre outros assuntos.
         Gisele desce, toma seu posto no portão. Atenta, estava atenta a tudo e ao mesmo tempo, sem perder as crianças e adolescentes de vista que estavam saindo, encostou em seu rádio de comunicação e, apalpando-o como quem procura algo, conseguiu senti o botão certo. Fazia isso enquanto olhava e gritava com alunos para que parassem de fazer bagunça. Apertou o botão que procurava sem olhar e se comunicou com seu colega de trabalho. Gisele pergunta ao companheiro, que também é seu marido, se estava tudo bem, tudo sob controle. O marido, inspetor Willson, consentiu a tranquilidade em seu posto de trabalho naquele momento, a quadra. Os alunos, na quadra coberta, conversavam, faziam fila na cantina, uns cantavam gritos de torcida, outros apenas olhavam o acontecia ao redor, a espera do jogo. Inspetor Willson era tão obeso quanto sua mulher, Gisele, ao ponto de não conseguirem ter relações conjugais físicas.
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              Na favela, ao som de funk e golpes de martelo na obra que acontecia, meninos conversavam no barraco de madeira que ficava ao lado do campo de terra onde jogavam futebol:
_ Ih, qual é neguinho? Não vai andar pra trás agora, né? – disse Lekin com raiva e gesticulando, característico de um bom malandro carioca.
_ Deixa o moleque, ele só tem 10 anos! – responde defendendo o “Menor”, apelido do menino, mais novo do grupo.
Lekin continua, sem dar atenção a defesa do Menor por parte do Marcelo, vulgo Cachaça:
_ Qual é Menor, nós num vai roubar nenhum banco, não! É só um empréstimo de celular ou bolsa, mochila, sem devolução, de qualquer “Playboy” ou “Patricinha” por aí! – disse já em tom de quem está quase rindo. Todos puseram-se a rir, gargalhar, achando graça da expressões de medo que Menor fazia.
Menor timidamente e com voz trêmula de choro responde:
_ Tá bom, é nós! Mas é só para vigiar mesmo, né?
Cachaça se antecipa a explicar, falando de uma forma como quem já havia explicando “mil vezes”:
_ Cacete moleque, já num te falei?- Disse com uma vareta na mão, desenhando o local no chão. _ Você vai ficar no local, na esquina, com a bike e se ver alguma alguma coisa suspeita, algum Pompeu, Milico, é só apitar com esse apito aqui- disse mostrando o apito- e se embrenhar pra dentro de “Todos os Santos” (localidade da região) e se entocar. Valeu? É, nós? Tá ligado?
Menor:
_ É nós então na parada!- disse cumprimentando cada um de seus amigos com o movimento do tipo tapa na mão e soco.
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_ Patrícia, é melhor a gente ir embora, não acha? Sei que temos que nos distrair de vez em quando, mas a prova…
Patrícia intercepta o que Melissa iria dizer e com um sorriso prossegue:
_ “… a prova da Faetec está chegando…”, já sei, já sei amiga. Relaxa um pouco, senão vai surtar!- Patrícia troca rapidamente o assunto ao ver Fábio _ Olha Melissa, aquele gostoso do Fábio! – disse abanando-se com a própria mão.
Melissa: _ Está bom, ele é lindo, mas temos que estudar…
Patrícia: _ Ai, ele está vindo em nossa direção! – disse sorrindo e procurando parecer que não tinha notado.
Fábio vem se aproximando, mas ainda de longe, diz alto:
_ E aí meninas, vocês vão ficar? Já estão indo?
Melissa: Já, estamos indo sim, tchau! – disse curta e grossa. Patrícia se dispõe a responder rapidamente o contrário:
_ Não, vamos ficar, claro que vamos. Jogo do Brasil, patriotismo. O que faríamos? – disse empolgada, sorrindo, como quem derrete de paixão, se esforçando para não deixar que Fábio percebesse. Esforço em vão.
Melissa responde com desdém:
_ O que faríamos? Estudar, é claro! – disse, porém enquanto falava ia se retirando em direção a saída pronunciando a ultima palavra mais alta.
         Fábio fica sem entender. Patrícia fica pensando que “pagou um mico” por causa da atitude da amiga, pensando que sua amiga exagerou… Melissa seguia em direção ao portão do colégio para sair. Estava abraçada aos livros e ao fichário, com a bolsa em cima do ombro direito. Pensando rapidamente e se indagando sobre o porque “ as pessoas estagnarem a vida por causa de futebol…” e “por que não conseguem se controlar diante de uma paixão, tendo elas que fazer coisas necessárias…”. Enquanto andava, mergulhada em suas questões, ouve:
_ Tchau, meu amor! Até amanhã! – disse com carinho, a inspetora Gisele.
        Menor estava posicionado conforme o combinado, na esquina da Rua Pedro de Carvalho com a Dias da Cruz. Cachaça e Tiquinho, ambos com 13 anos estavam na mesma caçada em que se localiza o colégio, espreitando no portão. Melissa, agora falava ao celular, combinando com uma amiga que havia faltado, para se encontrarem e estudar.
      Paralelamente atais acontecimentos, a Diretora recebia uma ligação.
Toca o telefone, a própria diretora atende:
_Centro Educacional Méier, Diretora, Maria Lúcia, boa tarde!
_ Oi, alô, alô, madame? Aqui é o Ferreira!
Indagou a diretora estranhando a identificação:
_ Ferreira? Que Ferreira? De onde?
_ Eu, o subordinado do Sargento Anselmo, Cabo Ferreira! Lembra? Ele mandou perguntar se a senhora vai liberar o “cafezinho”.
A Diretora responde debochadamente e exaltada:
_ E R$ 500,00 por semana é “cafezinho”? Só se for café para o batalhão inteiro! Não, diz ao Sargento Anselmo que não vai dar, que a vaca está magra aqui no colégio!- continuou dizendo _ Será possível que para termos segurança, não bastando o imposto, temos que pagar? Cabo Ferreira, são crianças e adolescentes! – exclamou com raiva, indignação e tristeza enfatizando as palavras “Crianças e adolescentes”.
          Cabo Ferreira, encabulado, sentindo-se vergonha por não estar cumprindo sua função de forma devida, responde meio abobalhado, como quem não tem prática no falar. Responde não se sentindo a vontade com alguém de nível social e cultural mais alto:
_ Olha, o Anselmo disse que era pra te dizer, que “já é a terceira vez consecutiva que não paga”, que não vamos poder ir pra ficar de prontidão aí hoje! Não foi eu madame, é ordem do chefe! Sabe como é que é, né… pra gente te ajudar, a senhora tem que ajudar nós também!
A Diretora responde exausta com a situação e da conversa em si, sentia-se mal:
_ Está bem, depois nos acertamos, está bom? Tchau, que eu tenho mais o que fazer! Tenho que educar para que haja policiais honestos neste Rio de Janeiro! – desligou, batendo o telefone, sem esperar resposta de Ferreira.
         Melissa sai pelo portão, vira a esquerda, falando ao celular. Lekin, o mais velho, estava com Cicatriz do outro lado da Rua, observando. Ao passar Melissa por Cachaça e Tiquinho, os dois disfarçam conversando entre si para a menina não perceber. Menor olha da esquina cada movimento de seus companheiros, estava muito tenso, com o apito na boca. Saia alguns sons do apito devido ao fato de, Menor, estar respirando mais intensamente.
       Lekin, que liderava o grupo, fez o sinal, Cachaça avançou no celular da menina. Melissa, menina forte e teimosa, levou um susto, porém em um ato de coragem não largou o celular, segurou firme, ficou relutando com Cachaça, enquanto que sem Melissa percebesse, Tiquinho pelo outro lado de Melissa, puxou com muita violência a bolsa, que estava sobre seus ombros. Neste momento Melissa solta um grito muito forte e caiu ao chão. Gisele, a inspetora, sai do portão em direção a Melissa, gritando que parassem. Corria como podia. Fábio, que tinha resolvido sair, percebeu o que acontecia e fez o mesmo logo que se deparou com tal cena, tão comum no Rio de Janeiro. Cachaça, com o celular na mão e tiquinho com a bolsa, batendo na menina, os dois. Ouvem os gritos de Gisele, percebem Fábio correndo e, nesse susto, Melissa mesmo machucada e caída, agarra os dois. Gisele mal se agüentando vai de encontro ao chão, num tombo, aflita, não consegue se levantar. Nesta luta, Fábio chega, acerta um soco em Cachaça. Melissa ao ver o soco, em frações de segundo, sentiu ter valido a pena ter segurado os dois, mas agora estava sozinha com Tiquinho. Com a bolsa, Tiquinho tentando livrar-se da menina, puxa com toda força para o alto, estendendo-a do chão bruscamente, jogando-a em direção em direção a rua. Passava um único carro no momento, que estava vazia por causa do jogo do Brasil x Holanda. O motorista tendo visto a cena e com medo, acelerou o máximo que pôde. Melissa, quando jogada, bateu de cabeça no carro e, desacordada, num golpe, pôs-se cair metros em direção contrária. Ouve-se dois tiros, com espaço não muito curto de tempo de cada tiro, pois o atirador percebeu ter errado o primeiro tiro. Fábio cai com um tiro, tiro que perfurou um pouco abaixo da região da axila, atingindo o coração. Cachaça e Tiquinho, com grande medo, pensando ter, o tiro, vindo de algum policial, saem em disparada montados, cada qual, em suas bicicletas.
Melissa estava jogada, com o crânio aberto devido a batida com o carro em alta velocidade. Fábio havia morrido. A bala que o atirador pensou ter errado, havia acertado Gisele, que estava no, desesperada, gritando todo momento que parassem, sem conseguir levantar-se. Três pessoas no chão, próximas umas das outras. Papéis do fichário misturavam-se ao sangue. Gisele em um último suspiro, a ultima coisa que ouve é um grito de gol.
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          No morro, todos os cinco com seus sistemas respiratórios em pelo rigor funcional, em máximo de seus funcionamentos, olhavam uns para os outros assustados. Não era para ter sido assim, era o que pensavam. Não estava nos planos. Menor abriu um choro desesperado. Lekin, o mais velho e cabeça do grupo, o que sempre se colocava acima dos outros e bolava os planos, ofegante ainda, estavam todos agachados, levantou-se, deixou aparecer um sorriso bem maroto, puxou a camisa e exibiu a pistola. Todos estavam estupefatos, atônitos, gelados. Nunca haviam tocado em assunto sobre portarem armas. Sequer poderiam imaginar que o tiro teria sido disparado por alguém que estivesse entre eles. Naquela confusão, Menor tinha sido o primeiro a correr, com medo, logo após Cicatriz. Depois: o tiro.
       Assim começou a sequência de assaltos dos cinco meninos. Começaram a se apresentar pelo com pichações pelo bairro, como “Bonde do Penta”. Assaltaram durante um ano pessoas inocentes: comerciantes, idosos, estudantes, ônibus, casas etc. Todos estavam em suas listas. Depois de apanhados algumas vezes, sempre se safavam, depois de surrados, entregando todo dinheiro que tinham. Já os policiais, saiam com dinheiro dos comerciantes e com dinheiro dos delinqüentes. Tudo isso fez que, com o passar do tempo, com uma região de bairros sob tensão, fossem, os cinco meninos, reconhecidos em rede nacional, através de um telejornal como: ” A morte do Bonde do Penta”.
Lucas Gonzaga